*Por Deborah Fortuna
Aprovada nesta semana na Câmara dos Deputados, a Medida Provisória nº 881/19, a MP da Liberdade Econômica, traz mudanças nos direitos dos trabalhadores e alterações nas regras para abertura de empresas. O texto agora segue para o Senado, que tem até 27 de agosto para apreciá-lo.
A MP está em vigor desde 30 de abril, quando foi publicada no Diário Oficial da União, mas, por se tratar de uma medida provisória, é preciso receber aval do Congresso para continuar valendo. Na Câmara, o texto foi aprovado, por 345 parlamentares contra 76, na madrugada quarta-feira (14/8). Durante a tarde seguinte, a Casa rejeitou os destaques (propostas de mudança) apresentados (veja abaixo o que muda com a MP)
O governo alega que a medida estabelece normas de proteção “à livre iniciativa e ao livre exercício de atividade econômica e disposições sobre a atuação do Estado como agente normativo e regulador”. Na avaliação do Planalto, as mudanças facilitam a abertura de empresas e desburocratiza o Estado.
O advogado especialista em direito empresarial e professor do Centro Universitário de Brasília (UniCEUB) Luiz Filipe Dutra concorda que os microempresários possam ser beneficiados com o texto. “A conversão da MP em lei, se o texto aprovado pela Câmara for efetivamente mantido no Senado, deve diminuir a burocracia e simplificar a abertura de novos negócios, em especial de pequenas e médias empresas, já que não haverá mais a necessidade de obter licenças prévias para o funcionamento de empresas cujas atividades são de baixo risco”, avalia.
O texto saiu da Comissão Especial com 53 artigos, mas acabou aprovado com 20. Entre os itens aprovados, relacionados à liberdade econômica, estão garantias para atividade econômica de livre mercado (abertura e fechamento de empresas), restrições ao poder regulatório do Estado, criação de direitos de liberdade econômica e regulamentação para a atuação do fisco Federal (veja as principais mudanças da MP).
Para Dutra, o texto encaminhado ao Senado é mais fidedigno ao texto original da MP, com “mais destaque para princípios gerais sobre liberdade econômica e interpretação de contratos empresariais do que para regras pormenorizadas relacionadas a temas diversos”.
Já o advogado na área de direito regulatório e professor do IDP Eric Hamann destaca que, a partir de agora, a administração pública deverá realizar uma análise de impacto regulatório antes de editar qualquer norma que afete interesses gerais dos agentes econômicos ou usuários de serviços. “Essa precisão é extremamente benéfica à sociedade, pois exige que o Estado utilize metodologia objetiva e transparente para a criação de políticas públicas”, avaliou.
Polêmicas
Algumas medidas da MP, no entanto, são consideradas mais polêmicas, por mexer com regras trabalhistas. Entre os pontos que mais provocam discussão estão o fim da folha de ponto e a alteração sobre o trabalho aos domingos e feriados.
Sobre este último tema, a medida estabelece que o pagamento em dobro pelo tempo trabalhado nesses dias pode ser substituído por uma folga em outro dia da semana. Hoje, a lei proíbe o trabalho aos domingos, exceto mediante permissão do governo em categorias autorizadas. Se o empregado é convocado nesse dia, ele recebe o dobro pelo serviço.
O advogado trabalhista Luciano Andrade Pinheiro, do escritório Corrêa da Veiga Advogados, afirma que a folga semanal ainda tem que ser respeitada por todos os empregadores. “A CLT dizia que o trabalho aos domingos só poderia acontecer por necessidade imperiosa do serviço, ainda assim, a prática era permitida em diversos setores. Só que, para ser autorizada, era necessária muita burocracia”, explica.
Agora, a MP retira esta regra e permite trabalho aos domingos, ainda que a empresa não comprove que a prestação de serviço é fundamental. “Entretanto, a folga semanal ainda deve ser respeitada por todos os empregadores”, afirma.
No caso do registro de ponto — que não será necessário fazer regime de controle quando a empresa tiver até 20 empregados —, e o registro de ponto por exceção — no qual a empresa não precisa registrar o ponto de entrada e saída do empregado —, Pinheiro afirma que isso pode ser uma forma de desburocratização. “Já há empresas que adotam esse sistema por acordo coletivo. O empregado só registra o ponto quando trabalhar horas a mais. As duas medidas visam a desburocratização da relação entre empregador e empregado”, afirmou.
Confira o que muda com a MP
Trabalho aos domingos
Como é: A Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) atualmente proíbe o trabalho aos domingos, exceto mediante permissão do governo, que precisa especificar as categorias autorizadas. A folga dominical deve ser concedida uma vez por semana no período mínimo de 24 horas. Quando empregado é convocado no domingo, recebe em dobro pelo serviço.
Como ficará: O texto da MP prevê que o descanso será “preferencialmente aos domingos”, com brecha para a concessão da folga em outros dias da semana. Nos casos em que o funcionário trabalhar aos domingos e feriados, o pagamento em dobro pelo tempo trabalhado pode ser substituído por uma folga em outro dia da semana. A folga dominical pode ser concedida dentro de um intervalo máximo de quatro semanas.
Carteira de Trabalho Eletrônica
De acordo com a MP, as carteiras de trabalho serão emitidas pelo Ministério da Economia “preferencialmente em meio eletrônico” e a única identificação do empregado será o CPF. A impressão em papel será exceção.
Os empregadores terão cinco dias úteis, a partir da admissão do trabalhador, para fazer as anotações. O trabalhador deverá ter acesso às informações em até 48 horas, contadas a partir da inscrição das informações.
Registro de ponto
As novas regras determinam registros de entrada e saída do do trabalho apenas para empresas com mais de 20 funcionários. Até então, a anotação era obrigatória para empresas com mais de 10 trabalhadores.
Sem alvará para atividades de baixo risco
O alvará será dispensado para atividades de baixo risco como costura e conserto de sapatos, por exemplo. O rol de atividades contempladas será determinado por ato do Poder Executivo, caso não haja regras estaduais, distritais ou municipais sobre o tema.
Substituição do E-social
O Sistema de Escrituração Digital de Obrigações Fiscais, Previdenciárias e Trabalhistas, que unifica o envio de dados sobre trabalhadores, será substituído por um sistema de informações digitais de obrigações previdenciárias e trabalhistas.
Abuso regulatório
A MP estabelece o que chama de “abuso regulatório”, definido como infração cometida pela administração pública ao editar norma que “afete ou possa afetar a exploração da atividade econômica”. Enquadram-se na definição normas ou atos como:
criar reservas de mercado para favorecer um grupo econômico em prejuízo de concorrentes; redigir normas que impeçam a entrada de novos competidores nacionais ou estrangeiros no mercado; exigir especificação técnica desnecessária para o objetivo da atividade econômica; criar demanda artificial ou compulsória de produto, serviço ou atividade profissional, “inclusive de uso de cartórios, registros ou cadastros”; colocar limites à livre formação de sociedades empresariais ou atividades econômicas não proibidas em lei federal.
Desconsideração da personalidade jurídica
A proposta altera as regras para a desconsideração da personalidade jurídica, detalhando o que é desvio de finalidade e confusão patrimonial. A chamada “desconsideração da personalidade” é um mecanismo fixado pelo Código Civil de 2002 que permite que sócios e proprietários de um negócio sejam responsabilizados pelas dívidas da empresa. A desconsideração é aplicada em processo judicial, por um juiz, a pedido de um credor ou do Ministério Público.
Negócios jurídicos
A proposta acrescenta um dispositivo no Código Civil que prevê que as partes de um negócio poderão pactuar regras de interpretação das regras oficializadas no acordo, mesmo que diferentes das previstas em lei.
Documentos públicos digitais
Agora, está permitido digitalizar documentos públicos. A versão digital passa a ter o mesmo valor probatório do documento original.
Registros públicos em meio eletrônico
Documentos registrados em cartório, como Certidão de Nascimento, agora podem ser escriturados, publicados e conservados em meio eletrônico.
Súmulas tributárias
A proposta cria uma regras para os fundos de investimento, definidos como “comunhão de recursos” destinados à aplicação em ativos financeiros e bens. A proposta estabelece as regras de registro do fundos na Comissão de Valores Imobiliários, as informações que deverão constar nos regulamentos dos fundos e as regras para solicitar a insolvência.
A medida institui ainda um comitê formado por integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais, da Receita Federal, do Ministério da Economia e da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. O grupo poderá editar súmulas da Administração Tributária Federal, que passarão a vincular os atos normativos praticados pelas entidades.
Fundos de investimento
Fim do fundo soberano
A proposta extingue o Fundo Soberano, vinculado ao Ministério da Economia.
Com informações do Estado de Minas