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Consciência Negra: episódios de racismo continuam persistindo no futebol

No último sábado (20/11), foi comemorado o Dia da Consciência Negra. A data promove o amplo debate em torno da igualdade racial e de combate ao racismo no Brasil. Apesar de toda a discussão em torno da temática, atos de discriminação racial no futebol brasileiro têm apresentado um aumento significativo nos últimos anos.
Quatro dias antes da data, após marcar um gol durante a partida entre Corinthians e Nacional do Uruguai, a brasileira Adriana foi chamada de “macaca” pelas jogadoras do outro time. As falas preconceituosas causaram tumulto entre as duas equipes e deixou as corintianas indignadas.
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Alguns dias antes, ocorreu outro caso de discriminação racial no campo, quando Brasil de Pelotas e Brusque jogavam pela Série B. Na ocasião, o torcedor Douglas Menezes chamou o zagueiro do Brusque, Sandro, de “negro desgraçado”. A ofensa também foi ouvida pelo companheiro de equipe Edilson.
 
Após o ocorrido, o Brasil de Pelotas foi punido com multa de R$ 30 mil por injúria racial praticada pelo torcedor do clube. Já Douglas foi proibido de frequentar os jogos do time como mandante por 900 dias. O caso foi julgado nesta quinta-feira (18/11) pela Quarta Comissão Disciplinar do Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD). Cabem recursos das decisões.
Ato criminoso
Maurício Corrêa da Veiga, especialista em direito desportivo e sócio da Corrêa da Veiga Advogados, destaca que é incompreensível que, em pleno século XXI, atitudes irracionais sejam manifestadas por torcedores de determinados clubes. “O racismo é um ato criminoso e tem que ser punido da forma mais severa possível”.
“O futebol tem a graciosa virtude de unir culturas e povos, sem distinção de credo, raça ou origem. A linguagem da bola é universal. Contudo, os recentes episódios de discriminação racial ocorridos nas partidas de futebol em território brasileiro demonstram, de forma inconteste, que o preconceito é uma chaga que envergonha o nosso país e que tem que ser erradicada de uma vez por todas”, afirma o advogado.
Para o diretor do Instituto Luiz Gama, Julio César Santos, o que falta em relação aos afrodescendentes é que o sistema, de forma estrutural, não condiciona a confiança na atuação de pessoas negras. “Excluindo a possibilidade de lugares de destaque, ou seja, é como se os jogadores negros estão à disposição para o espetáculo e não para dirigi-lo.
“O futebol engloba toda a organização do evento, e podemos observar a ausência na própria mídia de profissionais negros comentaristas, o que demonstra o viés inconsciente, no qual cria estereótipos que os negros não possuam capacidade de formular reflexões conjunturais referente futebol”, explica Santos.
Impacto na vida dos atletas
O diretor do Instituto afirma que as discriminações podem causar diversos tipos de impactos na vida dos atletas. “Desde a percepção dos jogadores negros da inexistência de trabalhos externos ao futebol, como a realização de campanhas publicitárias, pelo racismo fenotípico das instituições, que não desejam vincular suas marcas as pessoas negras”.
“Também impactos destrutivos nos campos das emoções, com quadros de ansiedade, depressão, síndrome do pânico, síndrome de burnout, entre outros males emocionais, fazendo com que os atletas negros absorvam as discriminações como algo natural, para manter seus contratos profissionais e serem aceitos”, completa o diretor.
O especialista cita ainda que há a questão da “negação racial”, onde o jogadores negros, que não sejam retintos, tentam de toda forma negar sua negritude. “Muitas vezes, sendo vítimas do fenômeno da cooptação racial, procurando se afastar de todos os ambientes tidos como de negros e também das temáticas que envolvam a emancipação racial”, pontua Julio.
O que os clubes devem fazer para impedir práticas de racismo?
Maurício Corrêa da Veiga, especialista em direito desportivo, ressalta que os clubes possuem meios de coibir práticas de discriminação racial. “Devem estipular campanhas preventivas e educativas com a finalidade de conscientizar o torcedor e da gravidade da conduta criminosa, que atingirá não apenas quem a praticou, mas poderá ter reflexos negativos para o clube”, aponta.
Segundo o advogado, o Código Brasileiro de Justiça Desportiva prevê penas duras para esta prática criminosa, inclusive com a exclusão do clube do torneio.
“A exclusão do time envolvido, daquele campeonato, pode parecer uma pena injusta e desproporcional, pois, afinal, foi apenas um grupo de indivíduos (não evoluídos) que cometeu o ato. Nada obstante, a partir do momento em que você pune a agremiação em razão do ato criminoso praticado por determinado grupo, possivelmente não haverá reincidência, pois os dirigentes terão cuidados redobrados no tocante a fiscalização de seus torcedores”, explica.
Maurício ressalta ainda que cabem aos operadores do direito desportivo a coragem de aplicar a pena prevista no item XI do art. 170 do CBJD e não serem omissos e coniventes com atitudes criminosas e que, portanto, devem ser banidas do futebol brasileiro.
“A batalha contra a discriminação racial é tarefa árdua e os casos de racismo que são noticiados causam perplexidade, porém, ainda são poucos aqueles cidadãos que têm coragem para enfrentar e mudar esta realidade”, conclui o especialista.
Reportagem publicada no Jornal de Brasília.