O ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, e lideranças do Partido dos Trabalhadores (PT) entraram em defesa da revogação da Reforma Trabalhista e de outras medidas, como o teto de gastos. A Lei 13.467/2017 foi aprovada ainda no governo de Michel Temer (MDB), em 2017. Para especialistas, a anulação poderá gerar impactos negativos para as empresas e empregados.
Segundo Maurício Corrêa da Veiga, advogado especialista em direito do trabalho e sócio do Corrêa da Veiga Advogados, caso Lula seja eleito nas próximas eleições, é possível haver uma revogação na medida.
“A Reforma Trabalhista foi introduzida no ordenamento jurídico por meio de lei ordinária. Logo, lei ordinária superveniente, apesar de indesejável, poderia revogá-la. A propósito, em 2017, o senador Paulo Paim foi o responsável por um projeto de lei cujo artigo 1º revogava expressamente a reforma trabalhista”, ressalta.
O especialista avalia que tal ação geraria um caos. “Além de demonstrar para o investidor estrangeiro uma instabilidade e insegurança, você criaria categorias de trabalhadores distintas, os que foram contratados antes da reforma, aqueles sob a égide da reforma trabalhista e uma terceira categoria com direitos possivelmente novos. O mercado ficaria arredio a novas contratações e poderia haver um esfriamento – ainda maior – na economia em razão da queda do consumo”, explica Corrêa da Veiga.
O advogado trabalhista e sócio da Advocacia Maciel, Tomaz Nina, afirma que a declaração de Lula por si só já gera impactos negativos. “Reflete diretamente nas empresas e empregados e até mesmo na sociedade como um todo, já que, além de causar incertezas, poderá frear o aperfeiçoamento das relações de trabalho, essência da própria Lei questionada”, explica o especialista.
Insegurança jurídica
Para Ronaldo Tolentino, advogado especialista em direito trabalhista e sócio da Ferraz dos Passos Advocacia, a possível anulação acarretará insegurança e instabilidade jurídica a empregado e empregador. “Em especial para os funcionários, alguns direitos contemplados pela jurisprudência e revogados pela reforma, seriam restabelecidos”.
“Pessoalmente, penso que a criação de postos de trabalho ou extinção não são causados por mais ou menos direitos trabalhistas. Penso que esta causa está no desenvolvimento econômico do país, que depende muito mais de outras reformas, como a política e a tributária do que uma trabalhista”, esclarece Ronaldo.
Alteração nas leis trabalhistas
Conforme o advogado Tomaz Nina, as alterações nas leis trabalhistas feitas em 2017, possivelmente não chegaram a sua maturidade para que já se pense em revogá-la ou concluí-la.
“O curto período de sua vigência está inserido dentro de uma crise econômica mundial provocada pela pandemia de Covid-19, o que, por certo, impactou o mercado de trabalho no Brasil e no mundo. Logo, seria covardia fazer qualquer analogia entre a Lei nº 13.467/17 e o desemprego atualmente no Brasil, que decorre essencialmente dessa crise”, disse o especialista.
No que toca a parte técnica, ele entende que a reforma trabalhista não retirou e muito menos precarizou direitos trabalhistas. “O que houve, em síntese, foi a flexibilização de determinadas modalidades de contratação, inclusive, dando mais poderes negociais as partes (empregado x empregador), fator que considero, inclusive, determinante para a manutenção de empregos durante esse período nebuloso da pandemia, cabendo registrar a modalidade do teletrabalho regulamentada pela reforma trabalhista”.
Já para Mauricio Corrêa da Veiga, as alterações provocadas tiveram muitos pontos positivos, como, por exemplo, “a adoção do trabalho intermitente que proporcionou o surgimento de novos empregos temporários e acabou por se tornar uma porta de entrada definitiva para o mercado de trabalho”.
“O pagamento de bônus para os empregados teve aumento, pois deixou de integrar ao salário e o trabalhador pode escolher como irá gozar as férias e negociar o recebimento de horas extras. Efetivamente os empregos não aumentaram, mas esse fato não tem relação com a reforma trabalhista, pois a legislação não gera empregos, mas sim assegurar meios que possibilitem um crescimento econômico que impactará na geração de empregos. No saldo final, a Reforma Trabalhista teve mais pontos positivos do que negativos e sua revogação seria um manifesto retrocesso e traria prejuízos para todos”, concluiu.
Matéria publicada no Mais Brasília.
Autor: itpresscomunicacao
Por Gabriela Coelho
Na quarta-feira (9), o plenário do Supremo Tribunal Federal vai retomar o debate para saber se as empresas podem ou não demitir por justa causa o trabalhador que não se vacinar contra a Covid. Ano passado, o caso foi levado para julgamento no plenário virtual, modalidade na qual os ministros depositam os votos eletronicamente, sem necessidade de reunião presencial. Após o relator e os ministros Alexandre de Morares, Edson Fachin e Cármen Lúcia votarem a favor da suspensão, o ministro Nunes Marques pediu destaque do processo, e o julgamento prosseguirá no plenário presencial.
Reportagem publicada no O Antagonista.
Recentes decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) podem ampliar o uso da ‘pejotização’ para contratar profissionais que exercem atividades intelectuais e são considerados hipersuficientes – com altos salários e nível superior de escolaridade. Os ministros vêm entendendo que a prática é uma forma de terceirização lícita.
Nesta terça-feira, ao analisar a contratação de médicos como pessoas jurídicas, o Supremo reforçou esse posicionamento “devendo apenas ser desconsiderada caso seja utilizada para camuflar relação de emprego”. O julgamento aconteceu na 1ª Turma.
A corrente vencedora ainda destacou que pessoas com alto nível de formação, como professores, artistas, locutores e outros profissionais que não se enquadram na situação de hipossuficiência, também poderiam entrar legalmente nesse modelo de contratação. O caso dos médicos foi julgado pela 1ª Turma, ao analisar uma reclamação (RCL 47843) do Instituto Fernando Filgueiras (IFF), de Salvador, responsável pela gestão de quatro hospitais públicos e uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) na Bahia. O instituto recorria de decisão do Tribunal Superior do Trabalho(TST), em uma ação civil pública movida pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), que havia considerado ilícita a contratação.11
O instituto alegou que a decisão do TST desrespeitou a decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF), em repercussão geral, ao admitir como lícita a terceirização ampla e irrestrita (RE 958252 – Tema 725 e ADPF 324). Desde setembro não cabe mais recurso dessa decisão.
A relatora, ministra Cármen Lúcia, manteve a condenação ao instituto. Para ela, de acordo com as provas colhidas no TRT, a contratação como pessoa jurídica teria caracterizado fraude à legislação trabalhista, pois teriam sido comprovadas relações de subordinação e de pessoalidade que caracterizam a relação de emprego. Ela foi acompanhada pela ministra Rosa Weber, mas foram vencidas.
O ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência ao entender que a decisão da Justiça do Trabalho contrariou os resultados produzidos no julgamento que acatou a terceirização. Ele foi seguido pelos ministros Luís Roberto Barroso e Dias Toffoli.
Segundo o advogado Mauricio Corrêa da Veiga, sócio do Corrêa da Veiga Advogados, essa decisão, sem dúvida, abre margem para novas discussões sobre a ‘pejotização’. “Até então, qualquer pejotização tinha a presunção de fraude. Agora se inverte esse polo, a presunção é de que é lícita e então a fiscalização tem que provar que houve fraude”, diz. Trata-se de um precedente muito favorável para as empresas, segundo Juliana Bracks, do Bracks Advogados. Isso porque deu a entender que o STF admitiu a ‘pejotização’ mesmo nos casos em que estão presentes os requisitos do artigo 3º da CLT.
O dispositivo considera como empregado toda pessoa que prestar serviços de natureza não eventual sob a dependência do empregador e mediante salário. “Nem na CLT reformada, não temos essa brecha para dizer que o empregado hipersuficiente, que tem autonomia intelectual, pode optar por PJ”, diz.
Com esse julgamento, ficou ainda mais claro que as empresas condenadas na Justiça do Trabalho por “contratar PJs” que sejam hipersuficientes poderão levar a discussão diretamente ao Supremo, por meio de uma reclamação, segundo o advogado Luiz Eduardo Amaral de Mendonça, do FAS Advogados.
Assim, as empresas poderiam passar a se livrar desse tipo de processo trabalhista mais rapidamente. O caminho para a ‘pejotização’ já tinha sido aberto pelo Supremo, em uma decisão de dezembro de 2020. Na ocasião, o Pleno admitiu a ‘pejotização’ para trabalhos intelectuais ao analisar uma ação movida pela Confederação Nacional da Comunicação Social (CNCOM).
Na ação, a entidade pedia a declaração de constitucionalidade do artigo 129 da Lei nº 11.196, de 2005 (ADC 66). O dispositivo trata da contratação de profissionais que exercem atividade intelectual como PJ. Por oito votos a dois, o Pleno admitiu a constitucionalidade do artigo.
Ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio e Rosa Weber. Não cabe mais recurso da decisão desde março do ano passado. Segundo o advogado Gustavo Binenbojm, que atuou em defesa da CNCOM, o Supremo, ao admitir o modelo de negócios de que esses profissionais poderiam ter contrato PJ para fins previdenciários e tributários, permitiu que eles não precisam ser contratados pela CLT. “O que é razoável, um William Bonner, um Gilberto Gil, eles têm condições de igualdade para negociar com seus contratantes”, diz Segundo Amaral, depois desses julgamentos, “o MPT e a fiscalização trabalhista terão que rever seus conceitos porque não se pode mais presumir que toda terceirização e toda pejotização é fraude”, diz. Procurados pelo Valor, a assessoria de imprensa do MPT e o IFF não retornaram até o fechamento da edição e o advogado da ação não foi localizado.
Matéria publicada no Valor Econômico.
Por Beatriz Olivon
O ministro Emmanoel Pereira assume hoje o cargo de presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Promete fazer uma “gestão intensa”. O motivo é o fato de não ter como cumprir os dois anos de mandato. Fará 75 anos em outubro e terá que se aposentar. Até lá, porém, pretende fortalecer a Justiça do Trabalho, incentivar uma política de inclusão e instalar uma comissão própria para discutir os avanços e retrocessos da reforma trabalhista de 2017.
O objetivo de Pereira com a comissão é buscar uma base empírica para evitar “achismos opinativos” ou “contaminação ideológica”. “A lei nunca se exaure, nunca está pronta e nunca estará.
É um trabalho em andamento e progresso constantes”, afirma o ministro em entrevista concedida ao Valor. Possibilidade de mudanças e até revogação da reforma (Lei nº 13.467, de 2017) surgiram em declarações recentes do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na ponta oposta, os defensores do texto, aprovado na gestão de Michel Temer, indicam que leva à preservação dos empregos. A reforma trabalhista gerou manifestações no TST quando ainda tramitava no Congresso Nacional. Uma comissão de ministros – 17 dos 27 integrantes – entregou um parecer contra o texto. Pereira não assinou o documento.
O novo presidente chegou ao TST nomeado pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso e ocupou a vaga da advocacia. Diferente do que acontece no Supremo Tribunal Federal (STF), no TST as vagas são “carimbadas”: advogado substitui advogado magistrado substitui magistrado e o mesmo acontece com os procuradores do trabalho.
A palavra final é do presidente, que recebe uma lista com três nomes. Um procedimento desse está em curso, com a abertura de uma vaga da magistratura. Os nomes aguardam a escolha presidencial. Pereira é um dos quatro indicados por Fernando Henrique Cardoso.
O presidente Jair Bolsonaro já indicou quatro nomes e vai escolher pelo menos mais um, igualando-se à ex-presidente Dilma Rousseff. Apesar da curta duração, o governo de Michel Temer aprovou três nomes. Mas o maior número de integrantes (dez) veio por indicação do governo do expresidente Lula. Em 2022, Pereira pretende fazer uma gestão intensa, considerando que terá menos de um ano à frente do TST.
A gestão, afirma, terá foco na busca compartilhada por soluções, com ampla participação dos ministros, presidentes de Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs), com os quais já se reuniu, associações de magistrados, do Ministério Público do Trabalho e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
O maior desafio, segundo Pereira, será reduzir o índice de descumprimento da legislação trabalhista, garantindo o cumprimento e a eficácia das decisões judiciais. Além disso, pretende garantir mais respeito às condições de trabalho e às normas de saúde e segurança no trabalho, sobretudo aos trabalhadores em situação de vulnerabilidade.
Existem duas prioridades para o presidente: uma delas é a defesa e a valorização da Justiça Trabalhista. “Não devemos jamais aceitar discursos e iniciativas que tenham como objetivo extinguir esse relevante braço do Judiciário”, afirma. A outra será uma política de defesa das minorias com inclusão e respeito à diversidade e à pluralidade.
Para Pereira, não basta apenas o acesso ao emprego e a estabilidade, é necessário garantir um ambiente inclusivo – a começar pelo TST, de acordo com o ministro. As novas formas de trabalho e de emprego, como as adotadas por aplicativos de entregas, também estão na pauta. Pereira lembra que a própria pandemia antecipou muitas discussões sobre essas modalidades de contratação e a reforma trabalhista trouxe um novo olhar que precisa ser debatido.
“Diminuir o desemprego e combater qualquer forma de subutilização da força de trabalho para garantir o trabalho digno será o grande desafio. Esse é um tema que seguirá no radar da Justiça do Trabalho pelo seu caráter de rápida transformação”, diz. O TST está em um momento de mudança na presidência e também com novos integrantes, que entraram em 2021.
São esperadas trocas na composição de turmas e nos gabinetes – os mais visados são os que têm menos processos. A tendência, por enquanto, é que os ministros que saem da presidência, vice e corregedoria troquem de gabinete com os que estão chegando à presidência.
Para o ex-ministro Barros Levenhagen, consultor no escritório Chiode Minicucci Advogados, por enquanto é uma incógnita qual será a composição das turmas. Ele afirma não se lembrar de outro período com tantas mudanças no TST – na presidência e com ministros recém-nomeados.
Segundo Daniel Chiode, sócio do mesmo escritório, mudanças na composição das turmas podem mudar o entendimento dos colegiados e até a jurisprudência, a depender do caso. Isso, acrescenta, torna difícil ter previsibilidade nas questões trabalhistas.
Mauricio Corrêa da Veiga, advogado trabalhista e sócio do Corrêa da Veiga Advogados, espera que a nova gestão siga a anterior, que foi tranquila, apesar de desenvolvida totalmente durante a pandemia. Em 2021, foram julgados 357.006 casos no TST e recebidos outros 327.542 – o estoque atual é de 568.265 processos. “A diferença é que será uma diretoria muito breve, de apenas oito meses, em razão da aposentadoria”, afirma.
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Por Gabriel Coccetrone
A Câmara dos Deputados aprovou, na noite desta quarta-feira (16), o Projeto de Lei 9622/2018, de autoria da deputada federal Érika Kokay (PT-DF), que acrescenta à Lei Pelé (Lei nº 9.615) um dispositivo que exige de clubes de futebol e entidades esportivas a promoção de medidas de proteção de crianças e adolescentes contra a violência sexual, como condição para receber recursos de bancos públicos. Para especialistas ouvidos pelo Lei em Campo, o texto é extremamente importante e, se for levado à frente, pode ser considerado uma grande conquista.
“Um PL que venha a demandar a responsabilidade social das entidades de futebol, tolhendo a possibilidade de recebimento de verbas derivadas de bancos públicos, toca num ponto fundamental não só em seu propósito primordial – proteção à infância – como para o desenvolvimento mais saudável do esporte em sentido global e em concordância com as medidas mencionadas”, afirma Luiza Castilho, advogada especialista em Governança e Compliance no futebol.
“Essa matéria é de extrema importância para a formação desportiva. Infelizmente não são raros os casos de assédio sexual no esporte, e essa alteração na Lei Pelé surge como mais uma forma de coibir essas atitudes reprováveis. Sem prejuízo da punição na esfera penal do criminoso, o clube deixará de receber incentivos de bancos públicos se comprovada essa prática. Atualmente, vários clubes recebem incentivos para desenvolvimento dos atletas.
Essa norma surge como um verdadeiro ‘compliance governamental’, de modo que o Poder Público não apoiará essas condutas ilícitas. No entanto, não basta a Lei e o compromisso ‘documental’ dos clubes, deve existir alguma forma de aplicação prática dessas medidas, para que a leinão fique sem utilidade”, avalia Luís Guilherme Zainaghi, advogado especialista em direito desportivo. “Quando pensamos em um ‘Projeto de Lei’, a projeção que nosso imaginário faz é sempre na direção de conceitos como justiça, necessidade, relevância social, praticidade para convívio entre instituições e pessoas.
Nesse contexto, o PL 9622/2018 vem trazer funcionalidade prática a preceitos normativos que já existem – como: artigos 6º, 7º, 217, 227 da Constituição Federal de 1988; do próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) no seu artigo 4º e 71º; a Carta do Direito da Criança e do Adolescente no Esporte, lançada em 1988, em Genebra na Suíça, relançada no congresso de Panathlon em Avignone (1996) e ratificada pelo Brasil por ocasião da promulgação da ‘Constituição Cidadã’ e do advento do ECA (1990); a Lei nº 13.257 de março de 2016, conhecida também como a Lei da Primeira Infância -, e ficam, por vezes, esquecidos no sono de uma realidade parcial ainda muito presente no meio esportivo, em especial no futebol”, analisa Diogo Medeiros, advogado especialista em direito desportivo.
O advogado Maurício Corrêa da Veiga, especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo, diz que o PL “traz uma importante iniciativa no combate a proteção e integridade dos menores” e afirma que “não há que falar em desrespeito à autonomia desportiva, pois não se trata de uma imposição legal, mas sim de uma condicionante para aqueles que se utilizam de verba pública. Medida salutar e importante para o desporto”.
Luiza Castilho lembra que a Convenção sobre os Direitos da Criança, assinada pelo Brasil em 1990, “antecipa a necessidade de adoção das medidas apropriadas a proteger as crianças de todas as formas de violência, sendo elas físicas ou psicológicas”. “Por sua vez, a FIFA tem como um dos seus principais objetivos o comprometimento com a segurança e preservação dos direitos humanos, daí também foi que surgiu o programa ‘FIFA Guardians’. Em contraste, não são raros os casos de violência no contexto esportivo – ainda que o número de relatos seja, normalmente, inversamente proporcional”, afirma.
Pelo texto do PL, as entidades sem fins lucrativos componentes do Sistema Nacional do Esporte somente poderão receber recursos da administração pública federal direta ou indireta mediante a assinatura de termo de compromisso de adoção de medidas para a proteção de crianças e adolescentes contra qualquer tipo de violência sexual. Entre as medidas estão o apoio a campanhas educativas, a qualificação dos profissionais que atuam no treino de crianças e adolescentes e a instituição de ouvidoria para receber denúncias de maus-tratos e de exploração sexual de crianças e adolescentes.
Além disso, também está previsto o esclarecimento dos pais sobre as condições a que são submetidos os alunos das escolas de formação de atletas e a prestação de contas anual junto aos conselhos tutelares, aos conselhos dos Direitos da Criança e do Adolescente e ao Ministério Público, sobre o cumprimento das normas. O texto deixa claro que “em caso de descumprimento das determinações legais de proteção de crianças e adolescentes levará à suspensão da transferência de recursos públicos para a entidade desportiva ou, no caso de patrocínio, ao encerramento desse contrato”.
É importante destacar ainda que o PL foi uma maneira encontrada pela deputada federal Érika Kokay de pressionar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) a cumprir um pacto assinado em 2014, pelo então presidente José Maria Marin, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, ficando acertado a adoção por parte da entidade brasileira de dez medidas de combate ao abuso sexual contra crianças e adolescentes nas escolinhas de futebol. Em 2017, integrantes da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara apontaram em uma audiência pública que a CBF não estava cumprindo com o que havia se comprometido há três anos.
O pacto assinado pela entidade incluía, por exemplo, a promoção de campanhas de prevenção dos crimes de exploração sexual; a qualificação de profissionais para atuação preventiva junto às crianças; o uso da ouvidoria da CBF para recebimento de denúncias; além da fiscalização das escolas de formação de atletas.
Na época, o Brasil estava se preparando para sediar a Copa das Confederações, a Copa do Mundo e as Olimpíadas, e a CPI buscava reunir esforços para garantir a proteção de crianças e adolescentes durante esses eventos. O PL 9622/2018 agora será encaminhado ao Senado Federal. Em caso de nova aprovação, irá à sanção presidencial.
Matéria publicada no UOL.
Por Gabriel Coccetrone
O PLS 68/2017, que institui a Lei Geral do Esporte, avançou mais um pouco nesta quarta-feira (23). A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado Federal aprovou a proposta, com substitutivo do relator e senador Roberto Rocha (PSDB-MA), que traz grandes novidades para o esporte, além de reunir todas as regras em um único diploma legal.
O texto é visto por especialistas como necessário e importante, sendo fundamental sua aprovação. “Já passou da hora de termos uma nova Lei Geral do Esporte, pois a Lei Pelé (Lei nº 9.615) está ‘remendada’ e não condiz com a realidade.
As expectativas são as melhores possíveis, pois passamos a contar com temas atuais que são vitais para o desporto”, afirma Maurício Corrêa da Veiga, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo. Wladymir Camargos, relator da Comissão de Juristas que elaborou o PL, comemorou a aprovação do projeto na CCJ.
“Fico feliz em ver que a contribuição que demos por meio da Comissão de Juristas do Senado para a adoção de uma nova Lei Geral do Esporte tenha dado este importante passo hoje no Senado. Trata-se de um avanço enorme na modernização do setor, com foco na efetividade do direito de acesso às práticas esportivas a todos os brasileiros, na construção de um verdadeiro Sistema Nacional do Esporte baseado em um Fundo Constitucional destinado a este fim, assim como na garantia da autonomia esportiva apoiada na maior responsabilidade de dirigentes e instituições da área.
Continuo confiante que o Senado aprovará o projeto e que logo possamos vê-lo sendo analisado também na Câmara dos Deputados”, disse o advogado. Elaborado por uma comissão de juristas, o PLS 68/2017 traz inovações para o esporte, incluindo mudanças na legislação atual (Lei Pelé).
Ao todo, o projeto aprovado nesta quarta-feira conta com 210 artigos e não mais os 270 da proposta original, abordando temas como: financiamento público e privado; gestão das entidades esportivas; regime de trabalho de atletas e treinadores; e infraestrutura das arenas esportivas.
Um dos pontos que chama a atenção no texto é a criação de uma espécie de “Lei da Ficha Limpa” para as entidades esportivas, impedindo as pessoas afastadas por gestão temerária ou fraudulenta de dirigir clubes e federações. Ao site da ‘Agência Senado’, o senador Roberto Rocha cita exemplos de fora do Brasil para defender a tipificação do crime de corrupção privada no esporte, algo inédito no ordenamento jurídico brasileiro.
“Nos Estados Unidos e na grande maioria dos países europeus, os acusados por malversação do dinheiro de entidades esportivas são processados por crime de corrupção privada. No Brasil, diante da lacuna legal, acusados desse tipo de prática pedem absolvição, sob a alegação da inexistência de qualquer delito penal no caso.
Em muitos casos, o Ministério Público tenta a condenação por outros crimes considerados mais genéricos, como estelionato ou apropriação indébita”, cita o relator. Outros temas abordados pelo PLS 68/2017 que estão atrelados ao esporte são: acesso a recursos públicos, combate ao preconceito/discriminação, controle de torcedores, direitos dos atletas, programa Bolsa-Atleta e o Sistema Nacional do Esporte.
Acesso a recursos públicos O texto prevê que o recebimento de recursos provenientes de loterias e eventuais isenções fiscais, e a celebração de convênios com a administração pública federal pelas organizações privadas vão depender da comprovação do atendimento a requisitos. Alguns deles são: a situação regular quanto a suas obrigações fiscais e trabalhistas; participação dos atletas nos órgãos e conselhos técnicos incumbidos da aprovação dos regulamentos das competições; e preenchimento de, pelo menos, 30% dos cargos de direção por mulheres. Combate ao preconceito/discriminação No substitutivo apresentado na CCJ, o relator acatou parte das 62 emendas.
Uma delas, sugerida pelo senador Fabiano Contarato (PT-ES), prevê que as torcidas organizadas que pratiquem condutas discriminatórias, racistas, xenófobas, homofóbicas ou transfóbicas serão impedidas de comparecer a eventos esportivos por até cinco anos.
A punição também serve para os integrantes e associados desses grupos. Essas condutas discriminatórias incluem “portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens ofensivas, ou entoar cânticos que atentem contra a dignidade da pessoa humana, especialmente de caráter racista, homofóbico, sexista ou xenófobo”.
Controle de torcedores em arenas esportivas Uma das emendas acolhida pelo relator no substituto determina o controle e fiscalização do acesso do público nas arenas esportivas com capacidade para mais de 20 mil pessoas, que deve contar com meio de monitoramento por imagem e com identificação biométrica dos presentes. Direitos dos atletas Outra novidade do texto, sugerida pelo senador Carlos Portinho (PL-RJ), é a determinação para que as premiações por resultados, conhecidas popularmente como “bichos”, por serem imprevisíveis e eventuais, não sejam consideradas como parcela de natureza salarial.
O mesmo serve para as “luvas” (adicional pago na assinatura do contrato) e para o “direito de imagem” (utilização da figura do jogador para fins publicitários). O PLS 68/2017 ainda ressalta as obrigações e deveres da associação esportiva em relação aos atletas, como “proporcionar as condições necessárias à participação nas competições, treinos e outras atividades”, além de reforçar a previsão de contrato especial de trabalho esportivo, escrito e com prazo determinado.
Segundo o texto do projeto, a vigência desse modelo de contratação nunca será inferior a três meses nem superior a cinco anos. Bolsa-Atleta O substitutivo aprovado pela CCJ converte o Bolsa-Atleta (previsto na Lei 10.891, de 2004) em uma política permanente e detalha que o programa é destinado prioritariamente aos atletas de alto rendimento em modalidades olímpicas e paraolímpicas.
O valor do benefício varia de acordo com qual categoria o atleta se está inserido: Atleta de Base; Estudantil; Atleta Nacional; Atleta Internacional; Atleta Olímpico ou Paralímpico; e Atleta Pódio. O senador Roberto Rocha apresentou algumas alterações no programa, como a não obrigatoriedade do beneficiário a se filiar ao INSS (Instituto Nacional de Seguro Social) e para estabelecer que o benefício será pago em até o limite de 12 parcelas mensais, e não em necessariamente 12 parcelas, como previa o projeto original. Sistema Nacional do Esporte O texto visa dar mais atenção ao Sistema Nacional do Esporte (Sinesp), prevendo a instituição e regulamentação do sistema para a gestão e a promoção de políticas públicas para o esporte.
É previsto a divisão de competências entre os entes federativos nos moldes do que já acontece na saúde e educação, no entanto, a adesão ao Sinesp não será obrigatória. Tramitação Agora, o PLS 68/2017 será levado para análise em caráter terminativo na Comissão de Educação, Cultura e Esporte (CE).
Matéria publicada no Uol.
Por Marcos Paulo Lima
A pouco mais de um mês do início da Série A, em 10 de abril, a invasão da Rússia à Ucrânia colocou uma pulga atrás da orelha dos times da elite nacional. Os cartolas consultam juristas especializados em busca de informações sobre um possível empréstimo ou até mesmo a contratação de brasileiros vinculados aos times com atividades suspensas em meio à guerra. O Brasil tem 43 jogadores nas três divisões do Campeonato Ucraniano. Trinta deles na Ukrainian Premier League. Treze somente no Shakhtar Donetsk. Entre eles, o ponta David Neres, alvo do São Paulo; ex-corintianos como o volante Maycon e o atacante Pedrinho; e o ex-rubro-negro Alan Patrick; além do zagueiro Marlon e do volante Fernando, entre outros. Na entrevista a seguir ao blog, o especialista em direito esportivo Maurício Corrêa da Veiga avalia as alternativas dos jogadores vinculados aos clubes ucranianos para reivindicar o direito de trabalhar e dos clubes diante da possibilidade de tê-los ou não no restante da temporada.
O Brasil tem 30 jogadores vinculados a clubes da primeira divisão do Campeonato Ucraniano. Como fica o vínculo empregatício deles em meio à invasão do país pela Rússia?
“O artigo 27 do regulamento de transferências da Fifa traz uma previsão de que questões de força maior serão resolvidas e dirigidas pelo Conselho da Federação Internacional de Futebol. Isso aconteceu com a covid-19, por exemplo.
O Brasileirão começa em 10 de abril. Há alguma chance de os times brasileiros tentarem o empréstimo de atletas em atividade na Ucrânia?
Neste momento, não há uma previsão de rescisão dos contratos em razão da guerra, mas entendo ser plenamente possível, razoável e justificável a rescisão indireta dos contratos de trabalho dos atletas estrangeiros que estão na Ucrânia, por exemplo, e que, em razão da guerra, estão impossibilitados, obviamente, de desempenhar suas atividades.
Quais seriam os desdobramentos?
A rescisão indireta provocaria consequências para os clubes que teriam de pagar com as cláusulas de rescisão e efetuar o pagamento da cláusula compensatória para os atletas — pagamento dos salários devidos até o fim dos contratos.
Portanto, assim como no início da pandemia, estamos diante de um caso inédito…
Este é um motivo de força maior e não tem previsão específica, mas a questão pode ser decidida pelo conselho da Fifa e acho plenamente razoável que isso ocorra.
Isso pode acirrar ainda mais a rivalidade entre Rússia e Ucrânia no campo esportivo?
Os clubes (ucranianos) depois poderiam buscar uma ação de regresso contra o Estado russo para que fossem ressarcidos dessas indenizações.
Publicada no Correio Braziliense.
Por Mauricio Corrêa da Veiga
“A conflagração de baionetas e de baterias fulmina e passa; as oposições sossegadas da serena vontade do povo ficam a história”, Eça de Queirós.
O futebol chegou na Ucrânia no final do século XIX e a teoria mais aceita diz que um grupo de pessoas ficou curioso e tentaram imitar o jogo praticado pelos marinheiros britânicos que se distraíam jogando bola enquanto seus navios estavam parados em Odessa. Relata Andy Dougan[1] que a primeira partida foi disputada na cidade de Lviv, na fronteira com a Polônia, em 5 de junho de 1892. O futebol passou a se tornar uma febre na Ucrânia que disputou sua primeira partida internacional contra o time turco do Fernerbache em 1914.
Os times de futebol foram criados em clubes esportivos já existentes em fábricas, escolas, escritórios e unidades militares. Em Kiev havia o Zheldor (também conhecido como Lokomotiv). Já o Dínamo era o clube esportivo da polícia e do Ministério do Interior em Kiev e contava com filiais em toda a União Soviética.
Em 1935, o Dínamo de Kiev, além de ser o melhor time da Ucrânia, já era reconhecido como um dos maiores clubes de futebol do mundo, graças ao talento de seus jogadores que eram aclamados durante competições internacionais, fazendo com que o futebol se tornasse um esporte nacional e que a União Soviética organizasse o seu primeiro campeonato de clubes no ano seguinte.
Infelizmente a alegria proporcionada pelo futebol durou poucos anos, tendo em vista a operação Barba-Roxa, deflagrada na primeira metade do ano de 1941 e que tinha como objetivo conquistar a União Soviética.
Nessa época, Josef Stálin mantinha a esperança de cumprimento do pacto de não agressão firmado entre a Alemanha e a União Soviética. Todavia, este não fora cumprido, pois Hitler acreditava que a Rússia poderia ser para a Alemanha o que a Índia fora para a Grã-Bretanha. “Sua doutrina da Lebensraum, ou espaço vital, clamava que a raça ariana precisava de espaço para crescer. Hitler tinha visões de uma rápida conquista da União Soviética, o que lhe permitiria explorá-la para extrair os recursos naturais necessários ao prosseguimento da guerra em outras partes do mundo”. Explica Andy Dougan[2].
Quando ficou evidente que as tropas alemãs invadiriam a União Soviética, os ucranianos foram imediatamente se alistar demonstrando verdadeiro sentimento de orgulho pelo país. Assim também o fizeram vários jogadores do Dínamo de Kiev que apenas tiveram tempo para retirar suas esposas e filhos da cidade, que foi dominada em agosto de 1941.
A guerra foi brutal e violenta. Quando os alemães se aproximaram de Kiev, os jogadores de futebol foram uns dos que lutaram desesperadamente para salvar a cidade e proteger suas famílias. Os jogadores do Dínamo que não estavam regularmente alistados no exército foram postos sob o comando de uma comissão especial de cidadãos.
A cidade foi capitulada em setembro de 1941 e incendiada por alemães e russos, estes últimos influenciados pela política da terra arrasada praticada por Stálin, nada deixando para o inimigo.
As pessoas que lá permaneceram ou eram dizimadas pelas armas inimigas ou ficavam desnutridas. O plano de Hitler era que os ucranianos fossem escravizados ou morressem de fome. É de se destacar que alguns habitantes permaneciam no local devastado, sob a expectativa na qual as coisas melhorariam sob o domínio alemão, eis que eram contrários ao regime de Stálin.
E foi justamente na Ucrânia que o time da “Padaria nº 3” mostrou ao mundo um ato de heroísmo e amor a pátria ao derrotar um time de futebol composto por militares alemãs e após este fato sofrer as consequência, no que ficou conhecido como o “jogo da morte”.
Quase um século se passou, mas a crueldade humana infelizmente ainda permanece!
Depois de pensarmos que após dois anos enfrentando uma pandemia mortal, o mundo se tornaria mais tolerante e pacífico, fomos surpreendidos com uma guerra desproporcional entre Rússia e Ucrânia, na qual ataques covardes ceifaram vidas inocentes de mulheres, crianças, idosos, jovens e atletas ucranianos.
Muitas foram as sanções aplicadas à Federação Russa no âmbito desportivo, valendo aqui destacar as seguintes:
1) A seleção russa de futebol disputaria uma das vagas na repescagem das Eliminatórias europeias. O país estava no Grupo B, ao lado de Polônia, Suécia e República Tcheca. A pena inicial aplicada pela Fifa foi mais amena e impunha uma “proibição” da equipe disputar jogos no país e de usar símbolos como bandeira, cores e hino. Após fortes críticas e pressão das federações polonesa e sueca, a exclusão foi confirmada (desta decisão houve interposição de recurso para o Tribunal Arbitral do Desporto – TAS);
2) A Federação Russa de Futebol foi sancionada pela FIFA e pela UEFA. Logo, a Rússia não poderá disputar nenhuma competição que seja organizada por estas entidades de administração do desporto. Desta forma, o Spartak Moscow foi excluído da Liga Europa e a seleção feminina de futebol não disputará a Eurocopa, que terá início em julho, na Inglaterra.
3) Por recomendação do Comitê Olímpico Internacional (COI), os russos foram excluídos (até segunda ordem) de competições internacionais de atletismo, hóquei no gelo, rúgbi, basquete, ciclismo, esqui alpino e escalada;
4) Exclusão dos Jogos Paralímpicos de Inverno, que começaram a ser disputados no dia 04/03/2022 em Pequim, após decisão tomada na véspera da cerimônia de abertura;
5) O Presidente Putin também foi punido com a perda de cargos na Federação Internacional de Judô e teve retirada a Ordem Olímpica pelo Comitê Olímpico Internacional (COI);
6) A UEFA rescindiu o contrato de patrocínio celebrado com a Gazprom, empresa estatal russa que atua no ramo da energia e gás natural. Além disso, remanejou a decisão da Liga dos Campeões de São Petersburgo, na Rússia, ao definir que o novo palco será o Stade de France, em Paris, no dia 28/05/2022;
7) O Comitê Olímpico Internacional (COI) recomendou que eventos programados para ocorrerem em território russo mudem a sua sede. Também foi recomendada a proibição de se tocar o Hino da Rússia e se use a bandeira do país durante as competições, o mesmo vale para Bielorússia;
8) A Federação Internacional de Automobilismo (FIA) cancelou a disputa do Grande Prêmio da Rússia de 2022, prevista para ocorrer em setembro. Além disso, o piloto russo Nikita Mazepin foi demitido da scuderia Haas.
A Rússia ignorou uma regra muito cara ao desporto que é a Trégua Olímpica, princípio que foi ratificado pelos 193 membros da ONU em 2021. Essa regra determina que ocorra um cessar-fogo a partir de sete dias que antecedem o início dos Jogos Olímpicos e como se sabe, no dia 04 de março tiveram início os Jogos Paralímpicos de Inverno de Pequim.
As sanções impostas demonstram a repulsa que essa guerra ocasionou em todo o mundo e o movimento desportivo foi firme e atuante.
Questão que provoca inúmeras reflexões diz respeito aos contratos de trabalho de atletas e treinadores de times russos e ucranianos.
O direito ao trabalho é um direito humano e social e por força desta odiosa e injustificável guerra, os atletas de ambos os países estão impossibilitados de prestarem os seus serviços.
Os atletas russos estão impedidos de jogar em razão das sanções impostas pelo movimento desportivo, o que atrai consequências imediatas para os atletas (muitos deles contrários a esta guerra nefasta).
Enquanto isso, em relação aos atletas ucranianos, não é preciso discorrer acerca de suas situações, tendo em vista que as imagens que reverberam em todo o mundo demonstram a devastação de uma nação.
Em robusto artigo doutrinário publicado no site da Academia Nacional de Direito Desportivo, o magistrado Marcos Ulhoa Dani, abordou, com muita perspicácia, a questão da força maior provocada pela guerra[3]. Verbis:
“Para analisar a situação dos atletas em questão, deve-se analisar a natureza jurídica do evento que vem tomando lugar na Europa oriental. Nos termos do art. 501 da CLT, entende-se como força maior todo acontecimento inevitável, em relação à vontade do empregador, e para a realização do qual este não concorreu, direta ou indiretamente. O conceito, apesar de constante do ordenamento brasileiro, pode, tranquilamente, ser aplicado à situação internacional ora descrita. Ou seja, a guerra é um evento externo e alheio às vontades das partes envolvidas na relação de trabalho futebolística, a saber, clubes ucranianos e atletas vinculados a tais clubes por um contrato especial de trabalho desportivo. Analisando o Regulamento de Status e Transferência de jogadores da FIFA (www.fifa.com), verifica-se que, ao contrário do que muitos defendem, não se pode aplicar ao caso em análise o disposto no artigo 14 do referido regulamento. O dispositivo citado regulamenta a terminação de um contrato desportivo de futebol quando ocorre uma justa causa.”
Compartilhamos do entendimento do ilustre magistrado no tocante a força maior e sua pertinência diante da guerra que arrasou muitos sonhos e planos. Desta forma, é preciso se socorrer do artigo 27 do Regulamento da FIFA, que estabelece que as situações não previstas no regulamento de status e transferências de jogadores e casos de força maior deverão ser decididas pelo Conselho da FIFA, cujas decisões serão terminativas para o caso.
E foi diante deste quadro de incertezas que a Fifa determinou a possibilidade de suspensão unilateral dos contratos (desde que não haja outras negociações entre as partes) até 30/06/2022, para atletas e treinadores que desempenhem as suas atividades na Ucrânia e na Rússia.
Portanto, neste período de suspensão, não será considerada quebra de contrato, o registro do atleta ou treinador por outro clube. Também não haverá indenização por formação nessas situações.
De forma muito salutar, a FIFA estendeu a janela de transferências e aumentou a quantidade de registros possíveis por temporada, sendo que cada clube só poderá contratar no máximo dois atletas nessa situação excepcional.
As cicatrizes provocadas por esta injustificável guerra deixarão marcas indeléveis em muitos seres humanos, em várias partes do mundo. O futebol e o desporto também sofrerão consequências, mas que sempre prevaleçam as virtudes do desporto.
Artigo publicado no Sem Olé na Lei.
O governo britânico anunciou recentemente uma série de medidas ao bilionário Roman Abramovich, dono do Chelsea. As sanções incluem congelamento de bens, proibição de viagens ao Reino Unido, impedimento de contratação de jogadores, entre outras normas que foram determinadas.
O advogado Fellipe Dias, especialista em direito desportivo e sócio do escritório Dias, Lima e Cruz Advocacia, explica que as medidas a Abramovich decorreram da sua relação com o presidente russo Vladimir Putin, e são uma das inúmeras estratégias que os países contrários à invasão na Ucrânia têm adotado para refrear e congelar quaisquer bens e patrimônios russos.
“A despeito de inúmeros impedimentos, que geram esses bloqueios ao clube, como o impedimento de venda do clube, a proibição de contratação e venda de atletas, houve a concessão de uma licença especial para que o clube possa manter sua folha de pagamentos, o que não deve gerar qualquer prejuízo aos atletas e demais funcionários do clube.”
Segundo Dias, não é possível a transferência dos atletas do clube, ao menos, não com qualquer repasse financeiro. “Ou seja, esses jogadores teriam que sair de forma gratuita ou esperar o encerramento dos seus contratos, uma vez que, enquanto estiverem mantidas as sanções sobre o Chelsea, o clube sequer pode renovar seus contratos”.
“Essas sanções e outras que vêm sendo aplicadas contra bilionários russos refletem a tentativa de combate à guerra que a Rússia tem travado com a Ucrânia. Isso gera com certeza um impacto no clube esportivo, mas se mostra como uma das alternativas razoáveis para diminuir o poder econômico da nação russa”, declarou o especialista.
Já para o advogado especialista em direito desportivo e sócio do Corrêa da Veiga Advogados, Mauricio Corrêa da Veiga, a punição pelo governo britânico não é razoável.
“O clube tem empregados, torcedores, patrocinadores e investidores e estes serão os sujeitos afetados diretamente. Contratos deixarão de ser cumpridos e os prejuízos para o clube serão incalculáveis”.
Para Corrêa da Veiga, a medida seria justa caso o ditador russo fosse o dono do clube, aí poderia se pensar em uma sanção semelhante, mas não a uma pessoa que tem relações com ele.
“Trata-se de uma sanção injusta que pune uma série de pessoas inocentes e não vai resolver a questão principal que é o fim da guerra”, concluiu o especialista.
Matéria publicada no IG Esportes.
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