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Decisão do São Paulo de cortar salários do elenco sem acordo não tem respaldo jurídico; entenda

Por Leonardo Lourenço

A decisão do São Paulo de cortar parte dos salários dos jogadores mesmo sem acordo com os atletas, como noticiou o Blog do PVC, não tem respaldo jurídico, de acordo com advogados especializados em direito do trabalho no esporte.

No limite, se levado à frente, o reajuste compulsório pode acarretar uma série de ações judiciais de rescisão de contrato dos jogadores.

O São Paulo busca formas de diminuir despesas durante a crise causada pela pandemia de Covid-19 que paralisou as atividades do futebol. Uma das negociações é o ajuste temporário no pagamentos do jogadores.

A proposta do São Paulo, como revelado nesta semana pelo GloboEsporte.com, inclui o corte e 50% do que é pago pela carteira de trabalho e a suspensão do pagamento de direitos de imagem, entre outras coisas.

O clube garante um pagamento mínimo mensal de R$ 50 mil e promete reembolsar todos os descontos no período em seis parcelas iguais a partir do momento em que a situação estiver normalizada.

Na última quarta-feira, o Governo Federal publicou Medida Provisória que prevê a redução proporcional do salário e da jornada de trabalho e também a suspensão temporária do contrato de trabalho. Em ambos os casos, o texto demanda a celebração de acordo por escrito entre empregado e empregador.

– Essa medida provisória, pelo meu modo de ver, precisa em todos os casos da concordância das partes. Veja que os principais artigos que tratam da redução de jornada de trabalho e redução de salários sempre contêm (a previsão de) acordo – afirmou o advogado Thiago Rino.

– Respondendo a pergunta de forma objetiva: a lei permite a redução sem concordância do atleta? Não – afirma o advogado Maurício Corrêa da Veiga.

Veiga, porém, entende que o momento extraordinário não deixa opções e que os atletas devem se conscientizar das dificuldades:

– Não há outra saída, a conta não fecha. A proposta do São Paulo foi muito razoável, pois não se trata de “corte”, mas sim de uma “moratória”, pois os 50% seriam devolvidos parceladamente depois do retorno das atividades. Se comparar com o que está sendo feito nos maiores clubes do mundo, pode-se dizer que a atitude dos atletas é mesquinha e individualista.

O São Paulo apresentou proposta aos atletas no início da semana, mas ela foi rejeitada pela maior parte do elenco. Sem acordo, o clube definiu apenas período de férias de 20 dias neste mês de abril.

Alguns jogadores entendem que a diretoria tenta incluir no acordo dívidas antigas que mantêm com os atletas. Esse jogadores querem primeiro receber os valores atrasados, para então discutir acordo relativo a pagamentos futuros.

Segundo o Blog do PVC, a redução será feita de qualquer maneira por causa das más condições financeiras do clube do Morumbi, cuja folha de pagamento do futebol profissional gira em torno de R$ 12 milhões mensais.

O jornalista cita uma fonte do departamento financeiro do São Paulo:

– Desculpe, eles não aceitaram, mas vai ser assim. Não tem o que fazer diferente. Mesmo os clubes que estão dizendo que vão tentar pagar normalmente depois das férias coletivas, como o Palmeiras, terão muita dificuldade, porque vai faltar dinheiro.

A decisão pode causar reclamações na Justiça do Trabalho:

– A Lei Pelé, no artigo 31, cita que, caso os salários, direitos de imagem ou FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), não sejam pagos por três meses, no todo ou em parte, ensejará em rescisão indireta do contrato de trabalho – afirma o advogado Filipe Rino, que atua ao lado do irmão, Thiago.

Nessa hipótese, no fim, o São Paulo pode ser condenado ao pagamento integral da multa rescisória prevista em contrato com cada jogador.

– Os ajustes dependem de acordo individual ou coletivo. Se os atletas ou o sindicato não aceitarem, qualquer alteração unilateral é irregular – diz o advogado Leonardo Laporta.

Laporta, porém, indica calma aos atletas:

– Não seria bem recepcionado esse pedido (de rescisão) pela Justiça na atual conjuntura (de crise causada pela pandemia). Sugiro apenas que cumpra a ordem imposta pelo clube e espere um prazo mínimo para as coisas se acalmarem, sem assinar nenhum documento consentindo com a proposta.

– No futuro eles podem exercer o direito garantido no contrato e se socorrerem do poder judiciário para receber a integralidade do valor previsto no contrato e, se for o caso, exigir a multa – completou.

O advogado Thiago Rino criticou a forma como o São Paulo tem atuado nesta questão:

– O São Paulo se precipitou. Utilizando a medida provisória ou a CLT, o salário de março teria que ser pago integralmente até o quinto dia útil de abril. Os cortes seriam para frente, ou seja, do mês de abril para ser pago em maio. São 20 a 25 dias para o clube bolar estratégia, mostrar números para os atletas e convencer o elenco antes de impor.

A diretoria do São Paulo ainda analisa o modelo de ajuste de despesas que será necessário nesse momento de crise e admite que será preciso equalizar as contas às receitas do período.

Fonte: Globo Esporte