Empresas de bebidas discutem contrato de venda do “bitter Campari” no Brasil
A Campari, empresa de bebidas, conseguiu se livrar, no Superior de Tribunal de Justiça (STJ), de ter que pagar indenização de cerca de R$ 100 milhões à Stock do Brasil. As duas brigam na Justiça há quase duas décadas por causa de um contrato firmado nos anos 1970 para a venda do “bitter Campari” no país.
A Stock recorreu ao Judiciário alegando que a Campari havia se aproveitado do seu know-how de venda da bebida e cobrava indenização por isso.
Conseguiu decisão favorável no Tribunal de São Paulo (TJSP). Os desembargadores afirmaram, em 2010, que os valores eram realmente devidos.
Mas a Campari, inconformada, levou o caso para o STJ. A 3ª Turma, depois de muitas idas e vindas, deu o veredicto em julgamento realizado nesta semana (REsp nº 1.727.824).
Know-how
Os ministros consideraram questionável o direito à indenização por não terem sido identificados, objetivamente, os elementos integrantes do suposto know-how da distribuidora – classificados como “secretos e originais”, que teriam sido apropriados pela Campari sem autorização.
O relator, Ricardo Villas Bôas Cueva, enfatizou que a formação de clientela normalmente está associada às estratégias do fabricante, à qualidade do produto e notoriedade da marca. Não ao esforço e dedicação do distribuidor.
Ausência de segredo industrial
Especialista em propriedade intelectual, Luciano Andrade Pinheiro, do escritório Corrêa da Veiga Advogados, contextualiza que know-how pressupõe segredo industrial e, em caso de divulgação do segredo industrial, há estabelecimento de multa.
“Neste caso específico, não há uso indevido de know-how pois não houve segredo industrial nos termos legais. O que existia era um contrato de distribuição. Todas as informações foram disponibilizadas mediante contrato”, ele afirma.
Para o especialista, o resultado poderia ter sido diferente se a Stock tivesse demonstrado, no processo, que houve deslealdade por parte da Campari.
Por Joice Bacelo.
Publicado no Valor Econômico.
Mês: abril 2022
O Tribunal de Justiça Desportiva de Santa Catarina (TJ-SC) concedeu ao atacante Ronny, do Camboriú, o direito de receber auxílio-acidente do Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) por conta das lesões que sofreu durante sua carreira, que inclui clubes como Botafogo e Palmeiras, e reduziram sua capacidade de jogar futebol.
O advogado trabalhista Domingos Zainaghi, colunista do Lei em Campo, ressalta que jogador de futebol é segurado da previdência como qualquer outro trabalhador. “Nesse caso, o atleta buscou receber o auxílio-acidente por conta de lesões decorrentes da profissão, e ganhou esse direito em decisão de segunda instância”, afirma
“O requerimento administrativo é uma formalidade que não pode ser condição para o deferimento do benefício do atleta. Por outro lado, seria injusto punir o último clube no qual o atleta atuou, pois, as sequelas são decorrentes de lesões que foram adquiridas com o passar dos anos. Tal situação demonstra que o ideal seria uma previdência especial e própria dos atletas que fosse mantida com a contribuição proporcional aos ganhos obtidos e que fosse suficiente para manter a subsistência destes profissionais após o fim de suas carreiras”, avalia Maurício Corrêa da Veiga, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
Ronny se lesionou gravemente pela primeira vez em 2014, pelo Botafogo, quando sofreu uma ruptura total do ligamento cruzado anterior. No ano seguinte, pelo Náutico, o atacante se lesionou novamente no mesmo local e teve que passar por cirurgia. Também no Timbu, o atleta teve uma ruptura do ligamento cruzado anterior e do menisco lateral. Por conta de todas essas lesões e afastamento do trabalho, o jogador recebeu auxílio-doença até o fim de 2015.
Diante das recorrentes lesões, Ronny ajuizou uma ação contra o INSS para continuar recebendo o benefício até sua aposentadoria dos gramados. O juízo de 1º grau da comarca de São José declarou prescritas as parcelas anteriores a 12 de abril de 2016 e condenou a autarquia a implementar o benefício de auxílio-acidente, desde janeiro de 2016, subtraídas as parcelas prescritas, correspondente a 50% do salário do benefício, com juros e correção monetária, devido até a véspera do início de qualquer aposentadoria ou óbito do segurado.
entrou com uma ação contra o INSS para continuar recebendo o benefício até a sua aposentadoria dos gramados. Dessa forma, o instituto terá que pagar as parcelas não efetuadas desde 2016 e continuar o pagamento até o atacante pendurar as chuteiras.
O INSS recorreu ao TJ-SC alegando que, passados mais de cinco anos desde o fim do benefício, Ronny não apresentou o requerimento administrativo confirmando seu interesse de continuar recebendo o auxílio-acidente. O instituto também sustentou que a carreira de um jogador de futebol é limitada à idade média de 35 anos e solicitou uma data final para benefício.
“Cumpre balancear, assim, a regra geral estabelecida pela Corte Suprema, a exigir o requerimento administrativo, com o lustro tido por este Sodalício como o razoável para garantir a implementação do auxílio-acidente, independentemente de outra solicitação, após a cessação do auxílio-doença, valorizando-se, ademais, os atos processuais praticados no bojo da demanda, mormente quando já confeccionado o laudo pericial”, diz parte da decisão.
Em processos dessa natureza, normalmente a regra prevê a necessidade de um requerimento do autor. Porém, o TJ-SC levou em consideração a existência de laudo pericial e confirmou o direito do jogador de receber o auxílio-acidente de forma unânime. O INSS ainda poderá recorrer da decisão em instâncias superiores.
Atualmente com 30 anos, Ronny defende o Camboriú e coleciona passagens também Criciúma, Figueirense, Palmeiras, Confiança, Itumbiara e União Rondonópolis.
Publicado no Uol.
Tema de grande relevância diz respeito à competência territorial para o ajuizamento de reclamação trabalhista de atleta profissional, tendo em vista que a regra constante na Consolidação das Leis do Trabalho deve ser analisada com muita cautela, sob pena de inviabilizar o direito de defesa da entidade de prática desportiva.
O art. 651 da CLT e os seus parágrafos trazem as normas de fixação de competência para o ajuizamento de reclamação trabalhista. Verbis:
Art. 651. A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento é determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.
§ 1º – Quando for parte de dissídio agente ou viajante comercial, a competência será da Junta da localidade em que a empresa tenha agência ou filial e a esta o empregado esteja subordinado e, na falta, será competente a Junta da localização em que o empregado tenha domicílio ou a localidade mais próxima.
§ 2º – A competência das Juntas de Conciliação e Julgamento, estabelecida neste artigo, estende-se aos dissídios ocorridos em agência ou filial no estrangeiro, desde que o empregado seja brasileiro e não haja convenção internacional dispondo em contrário.
§ 3º – Em se tratando de empregador que promova realização de atividades fora do lugar do contrato de trabalho, é assegurado ao empregado apresentar reclamação no foro da celebração do contrato ou no da prestação dos respectivos serviços.
Nota-se, portanto, que a regra para a fixação da competência está no caput do art. 651 e esta será determinada pela localidade onde o empregado, reclamante ou reclamado, prestar serviços ao empregador, ainda que tenha sido contratado noutro local ou no estrangeiro.
Os parágrafos do art. 651 da CLT enumeram exceções à regra contida na cabeça do referido artigo e para este estudo nos interessa a previsão contida no parágrafo terceiro, que determina que em se tratando de empregador que promova realização de atividades fora do lugar do contrato de trabalho, é assegurado ao empregado apresentar reclamação no foro da celebração do contrato ou no da prestação dos respectivos serviços.
Este tema veio à tona após interessante julgamento que ocorreu em fevereiro de 2022, quando a 3ª Turma do TST não conheceu de Recurso de Revista do Sampaio Corrêa, clube do Estado do Maranhão, que questionava o fato de seu ex-atleta ter ajuizado reclamação trabalhista no Rio Grande do Sul.
Ao julgar o Recurso de Revista nº 20965-94.2015.5.04.0241, o relator, Ministro Alexandre Agra Belmonte votou no sentido de não conhecer do recurso do clube e adotar o voto, cuja ementa segue abaixo:
RECURSO DE REVISTA. LEI 13.467/17. ATLETA PROFISSIONAL. COMPETÊNCIA TERRITORIAL. LOCAL DA CELEBRAÇÃO DO CONTRATO. POSSIBILIDADE.
A lide versa sobre a competência territorial para o ajuizamento da reclamação trabalhista de atleta profissional. Extrai-se do v. acórdão regional, soberano na análise das provas, que o trabalhador foi contratado em seu domicílio (Alvorada/RS) para prestar serviços como atleta profissional no município de São Luís/MA. O art. 651, § 3º, da CLT, em seus termos, possibilita ao empregado apresentar reclamação no foro da celebração do contrato ou no da prestação dos respectivos serviços, quando o empregador promova a realização de atividades fora do lugar do contrato de trabalho. No caso, o empregador – entidade de prática desportiva – realiza atividade fora do lugar da contratação, razão pela qual o atleta pode escolher entre este e o lugar da execução do contrato . Logo, a decisão do regional que manteve a competência territorial da vara do trabalho do local da contratação (Alvorada-RS) está em conformidade com a regra específica fixada no art. 651, § 3º, da CLT, não se havendo falar em violação da regra geral do art. 651, caput, da CLT. Recurso de revista não conhecido.
(TST – 3ª Turma – RR 20965-94.2015.5.04.0241, Relator Ministro Alexandre Agra Belmonte – DJU 25/02/2022)
O Ministro relator entendeu que o acórdão regional, soberano na análise das provas, afirmou que o atleta foi contratado em seu domicílio em Alvorada (RS), para prestar serviços em São Luís (MA).
Houve transcrição do acórdão regional que mencionava que havia e-mail e passagem emitida em nome do reclamante que seriam suficientes para demonstrar que o atleta já estava contratado antes mesmo de se deslocar ao município São Luís, o que foi corroborado em reportagem veiculada no site do clube no dia 06/01/2014.
Neste tópico, portanto, foi aplicada a Súmula nº 126/TST que não permite a revisão de fatos e provas pela mais alta Corte Trabalhista do Brasil.
Com efeito, o atleta profissional não pode se valer do fato de disputar partidas em cidades dos clubes adversários para ampliar o leque de possibilidades para ajuizamento de reclamação trabalhista.
Outrossim, o foro do domicílio do reclamante somente poderá ser o competente para receber e processar a reclamação trabalhista quando uma empresa de grande porte tiver atuação nacional, o que não é o caso de um clube de futebol que apesar de disputar partidas em diferentes Estados brasileiros e até no exterior, possui suas atividades vinculadas a sua sede. Portanto, a simples declaração de hipossuficiência do empregado não autoriza o deslocamento da competência.
Vale aqui trazer à tona decisão da SBDI-I/TST acerca deste tema relacionado a fixação da competência territorial. Verbis:
RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO PELO RECLAMANTE – COMPETÊNCIA TERRITORIAL – RECLAMAÇÃO TRABALHISTA AJUIZADA NO FORO DO DOMICÍLIO DO RECLAMANTE – LOCALIDADE DISTINTA DA CONTRATAÇÃO E PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS.
- Nos termos do art. 651, caput, da CLT, em regra, a competência para o ajuizamento de reclamação trabalhista é da localidade em que o empregado presta os serviços.
- Os parágrafos do referido dispositivo estabelecem as exceções a essa regra e, dentre elas, avulta a do § 3º que possibilita a apresentação da reclamação na localidade da celebração do contrato ou na da prestação dos serviços.
- A SBDI-1 vem admitindo, excepcionalmente, a competência territorial do foro do domicílio do autor em se tratando de empresa de grande porte e âmbito nacional, que realiza contratação e presta serviços em localidades distintas do país.
- No entanto, o quadro fático do acórdão regional não revela a atuação da reclamada fora da localidade em que se deu a prestação de serviços, razão pela qual a decisão embargada não merece reparos. Precedentes.
Recurso de embargos conhecido e desprovido.
(SBDI-I/TST – E-ED-RR-286-76.2016.5.21.0011 – Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Mello Filho – DJU 06/09/2019)
Desta forma, deve ser assegurado ao clube o direito ao contraditório e à ampla defesa, resguardando a este os meios inerentes à defesa de seus direitos
Com todas as vênias ao ilustrado relator que proferiu a decisão anteriormente destacada, um clube de futebol que desempenha as suas atividades na cidade de São Luís, não pode ser compelido a se defender no extremo sul do país. Já o atleta, teria que apresentar a sua reclamação trabalhista perante o TRT da 16ª Região, pois foi perante aquela localidade que escolheu atuar e prestar os seus serviços.
Nos siga nas redes sociais: @leiemcampo
Texto publicado no Lei em Campo.