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Desemprego acentuado e opção na várzea: jogadores temem efeitos de pandemia no futebol

Por Leonardo Lourenço

A incerteza sobre a continuidade do calendário do futebol e a convicção de que as receitas vão despencar fazem com que grandes clubes negociem com seus atletas a possibilidade de corte nos salários enquanto durar a crise causada pela pandemia da Covid-19, o novo coronavírus.

Há uma grande parcela de jogadores, porém, cujos contratos acabam até o final deste mês de abril. Para esses, não existe corte de salários a negociar a partir dali. Nem salário. A perspectiva é de desemprego.

O segundo semestre é, recorrentemente, período de menor oferta de vagas no futebol, mais abundantes na primeira metade da temporada com a disputa dos estaduais, com mais clubes em ação.

Desta vez, porém, há mais portas fechadas. Sem saber como e, principalmente, quando a crise será resolvida, os clubes interromperam negociações com atletas.

– Com este cenário atual, eu estou bem preocupado. Não tenho nenhuma reserva, e as contas não esperam. No momento, eu e minha família dependemos somente do futebol – conta o goleiro Rodrigo Calchi.

Casado e com dois filhos, Calchi tem contrato até o meio de abril com o Anapolina, de Goiás, e diz ter salários atrasados.

Por causa da epidemia e pela paralisação do torneio goiano, o jogador deixou o Centro-Oeste e voltou para São Vicente, no litoral paulista.

– Ia ficar lá até receber, mas fiquei com medo de fecharem os aeroportos, e resolvemos vir embora.

O goleiro deixou para trás, também, duas propostas para o restante da temporada: uma de um clube da Série D, com contrato até novembro, e outra da segunda divisão paranaense, com vínculo de três meses.

O atacante Erminio, do Taubaté, da Série A2 de São Paulo, voltou para Camaçari, na Bahia, quando o torneio foi interrompido. Ele tem contrato com a equipe paulista até o dia 30 e nenhuma perspectiva de voltar a vestir a camisa do time na atual competição.

Em sua terra natal, ajuda a mãe e quatro irmãos. Conta com o aluguel de alguns imóveis para fechar as contas, mas teme calotes nos próximos meses:

– Temos essas casas, mas com essa pandemia do coronavírus está complicado – afirma o atacante, que planejava disputar a Série B ou C do Brasileiro.

Medo do contágio

A situação financeira do atacante Denner é menos preocupante. Ele está vinculado ao Juventus, da primeira divisão de Santa Catarina, e também teve as negociações paralisadas.

Mas diz que se apoia na esposa, esteticista, para “segurar as pontas”. O medo é de contágio pelo novo coronavírus.

– Estou assustado demais. Aqui no condomínio onde eu moro, existem pessoas infectadas. Não estamos saindo de casa por nada – conta Denner, que tem quatro filhos (duas meninas, gêmeas, nasceram há quatro meses).

– Surgiram algumas possibilidades (de negociação com outros clubes), mas quando a competição estava rolando. Agora todos os clubes estão parados, quase ninguém está preocupado com contratação – diz Denner, antes de se corrigir:

– Na verdade, acho que ninguém está preocupado com contratação, né?

Opção na várzea

A dificuldade em buscar um emprego no segundo semestre não é novidade para o zagueiro Diego Borges, da Portuguesa Santista, equipe da segunda divisão de São Paulo.

– Nunca nos planejamos no futebol, pelo menos nós que temos contratos curtos. Agimos um campeonato por vez – conta ele.

– Há anos a minha situação é um primeiro semestre com muitas propostas, mas o segundo… só Deus na causa. Esse ano creio que será ainda mais difícil por tudo o que está acontecendo.

Com um filho de seis anos e a esposa grávida, Diego vê a várzea como uma opção para o resto do ano.

– A gente acerta com um time, e ele paga R$ 250, R$ 300, até R$ 350 por jogo. Com três ou quatro jogos por semana, eu ganho o que um clube me pagaria no segundo semestre – afirma o zagueiro.

– O bicho (valor pago por partida) é certo. Eu combino de receber antes para não correr risco. Não é só isso que o amador de São Paulo oferece: se você se machuca, dão suporte com fisioterapia, pagam academia, dão chuteira, lanche, material de jogo.

Os torneios amadores em São Paulo, assim como o futebol profissional, foram interrompidos como medida de distanciamento social no início da pandemia.

Medidas do governo

Estudo da consultoria Ernst & Young apresentado no final do ano passado, com base em dados de 2018, apontou que foi pago R$ 1 bilhão em salários a jogadores profissionais naquele ano.

A divisão do bolo é muito desigual: 7% dos atletas ficaram com R$ 800 milhões; 88% dos profissionais ganharam no máximo R$ 5 mil mensais.

Nesta semana, o Congresso aprovou medida que destina R$ 600 mensais a pessoas de baixa renda, trabalhadores informais e desempregados por três meses como medida emergencial para minimizar os efeitos da crise econômica causada pela epidemia da Covid-19.

Advogado especializado em direito do trabalho no esporte, Maurício Corrêa da Veiga entende que as ações do Governo Federal não alcançarão os profissionais do futebol.

– Para fazer jus ao auxílio é preciso cumprir alguns requisitos, como não ter recebido mais de R$ 28.559,70 em 2018 – diz ele.

– É um critério ruim para atletas, pois se em 2018 ele jogou por algum clube com salário de R$ 2.200 por mês, não terá direito ao benefício.

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Trecho da MP que permite redução de salário tem constitucionalidade questionada

Por Fernanda Trisotto
A medida provisória (MP) 936, que permite que a redução proporcional de jornada e salário e a suspensão dos contratos de trabalhos, tem um trecho que pode ter sua constitucionalidade questionada. O problema seria em permitir que essas medidas sejam feitas por meio de acordos individuais. Embora haja previsão para a redução salarial proporcional ao corte da jornada de trabalho na CLT, o texto constitucional determina que isso só pode ser feito via negociação coletiva. O trecho já é alvo de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI), protocolada no Supremo Tribunal Federal (STF).
A leitura de vários especialistas ouvidos pela reportagem é a de que se vive um momento extraordinário, em que se faz necessário flexibilizar algumas regras para tentar garantir a manutenção de empregos. Ainda assim, a avaliação é de que a adesão de empresas a esse tipo de medida pode ser inviabilizada por uma questão de insegurança jurídica.
O texto da MP determina que os acordo individuais para suspensão de contratos de trabalho só poderão ser firmados com empregados que recebem até três salários mínimos (R$ 3.135) ou aqueles que ganham mais de duas vezes o teto do INSS, que está em R$ 12.202,12, e possuem ensino superior. Caso haja um acordo coletivo, ele passa a valer para todos os trabalhadores, sem critério de renda.
Acordo individual contraria Constituição
A advogada trabalhista Mariana Machado Pedroso, sócia do Chenut Oliveira Santiago Advogados, lembra que a CLT já prevê negociação para redução da remuneração em até 25%, desde que observado o valor do salário mínimo, caso fosse reconhecido um motivo de força maior. “A Constituição também traz a possibilidade da redução salarial, mas faz uma ressalva expressa de que só seria possível se fosse negociada coletivamente”, aponta.
Ainda assim, a advogada defende que é importante a adoção de medidas que fazem com que as dispensas, as demissões em massa, não sejam as primeiras medidas a serem tomadas pelos empregadores. “Tanto as ações de proteção dos empregados quanto das medidas produtivas, ambas têm que partir sua análise do momento de extraordinariedade que estamos vivendo”, avalia.
Análise semelhante é feita pela advogada trabalhista empresarial Karen Badaró Viero, sócia do Chiarottino e Nicoletti Advogados. “O trecho é inconstitucional, mas temos de pensar no estado de calamidade pública”, resume. A orientação que ela repassa aos clientes é tentar fazer esse tipo de negociação por acordo coletivo. Caso a empresa esteja atravessando um momento muito delicado, quase quebrando, buscar um acordo individual pode ser a solução, desde que haja em paralelo uma tentativa de negociação coletiva. “É uma forma de garantir que não haja demissão em massa. Como o Judiciário vai se comportar com isso são outras questões, que veremos a partir do ano que vem em ações”, pondera.”
Fonte: Gazeta do Povo

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Decisão do São Paulo de cortar salários do elenco sem acordo não tem respaldo jurídico; entenda

Por Leonardo Lourenço

A decisão do São Paulo de cortar parte dos salários dos jogadores mesmo sem acordo com os atletas, como noticiou o Blog do PVC, não tem respaldo jurídico, de acordo com advogados especializados em direito do trabalho no esporte.

No limite, se levado à frente, o reajuste compulsório pode acarretar uma série de ações judiciais de rescisão de contrato dos jogadores.

O São Paulo busca formas de diminuir despesas durante a crise causada pela pandemia de Covid-19 que paralisou as atividades do futebol. Uma das negociações é o ajuste temporário no pagamentos do jogadores.

A proposta do São Paulo, como revelado nesta semana pelo GloboEsporte.com, inclui o corte e 50% do que é pago pela carteira de trabalho e a suspensão do pagamento de direitos de imagem, entre outras coisas.

O clube garante um pagamento mínimo mensal de R$ 50 mil e promete reembolsar todos os descontos no período em seis parcelas iguais a partir do momento em que a situação estiver normalizada.

Na última quarta-feira, o Governo Federal publicou Medida Provisória que prevê a redução proporcional do salário e da jornada de trabalho e também a suspensão temporária do contrato de trabalho. Em ambos os casos, o texto demanda a celebração de acordo por escrito entre empregado e empregador.

– Essa medida provisória, pelo meu modo de ver, precisa em todos os casos da concordância das partes. Veja que os principais artigos que tratam da redução de jornada de trabalho e redução de salários sempre contêm (a previsão de) acordo – afirmou o advogado Thiago Rino.

– Respondendo a pergunta de forma objetiva: a lei permite a redução sem concordância do atleta? Não – afirma o advogado Maurício Corrêa da Veiga.

Veiga, porém, entende que o momento extraordinário não deixa opções e que os atletas devem se conscientizar das dificuldades:

– Não há outra saída, a conta não fecha. A proposta do São Paulo foi muito razoável, pois não se trata de “corte”, mas sim de uma “moratória”, pois os 50% seriam devolvidos parceladamente depois do retorno das atividades. Se comparar com o que está sendo feito nos maiores clubes do mundo, pode-se dizer que a atitude dos atletas é mesquinha e individualista.

O São Paulo apresentou proposta aos atletas no início da semana, mas ela foi rejeitada pela maior parte do elenco. Sem acordo, o clube definiu apenas período de férias de 20 dias neste mês de abril.

Alguns jogadores entendem que a diretoria tenta incluir no acordo dívidas antigas que mantêm com os atletas. Esse jogadores querem primeiro receber os valores atrasados, para então discutir acordo relativo a pagamentos futuros.

Segundo o Blog do PVC, a redução será feita de qualquer maneira por causa das más condições financeiras do clube do Morumbi, cuja folha de pagamento do futebol profissional gira em torno de R$ 12 milhões mensais.

O jornalista cita uma fonte do departamento financeiro do São Paulo:

– Desculpe, eles não aceitaram, mas vai ser assim. Não tem o que fazer diferente. Mesmo os clubes que estão dizendo que vão tentar pagar normalmente depois das férias coletivas, como o Palmeiras, terão muita dificuldade, porque vai faltar dinheiro.

A decisão pode causar reclamações na Justiça do Trabalho:

– A Lei Pelé, no artigo 31, cita que, caso os salários, direitos de imagem ou FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), não sejam pagos por três meses, no todo ou em parte, ensejará em rescisão indireta do contrato de trabalho – afirma o advogado Filipe Rino, que atua ao lado do irmão, Thiago.

Nessa hipótese, no fim, o São Paulo pode ser condenado ao pagamento integral da multa rescisória prevista em contrato com cada jogador.

– Os ajustes dependem de acordo individual ou coletivo. Se os atletas ou o sindicato não aceitarem, qualquer alteração unilateral é irregular – diz o advogado Leonardo Laporta.

Laporta, porém, indica calma aos atletas:

– Não seria bem recepcionado esse pedido (de rescisão) pela Justiça na atual conjuntura (de crise causada pela pandemia). Sugiro apenas que cumpra a ordem imposta pelo clube e espere um prazo mínimo para as coisas se acalmarem, sem assinar nenhum documento consentindo com a proposta.

– No futuro eles podem exercer o direito garantido no contrato e se socorrerem do poder judiciário para receber a integralidade do valor previsto no contrato e, se for o caso, exigir a multa – completou.

O advogado Thiago Rino criticou a forma como o São Paulo tem atuado nesta questão:

– O São Paulo se precipitou. Utilizando a medida provisória ou a CLT, o salário de março teria que ser pago integralmente até o quinto dia útil de abril. Os cortes seriam para frente, ou seja, do mês de abril para ser pago em maio. São 20 a 25 dias para o clube bolar estratégia, mostrar números para os atletas e convencer o elenco antes de impor.

A diretoria do São Paulo ainda analisa o modelo de ajuste de despesas que será necessário nesse momento de crise e admite que será preciso equalizar as contas às receitas do período.

Fonte: Globo Esporte

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Da revolução industrial ao home office: como a tecnologia alterou as relações de trabalho ao longo do tempo

Matheus de F. Corrêa da Veiga e Luísa B. B. Corrêa da Veiga*
A Revolução Industrial deu início a uma avalanche de mudanças nas relações de trabalho cujos efeitos são percebidos ainda hoje. Os trabalhadores, que até então estavam acostumados com as condições árduas, mas dignas do trabalho no campo, depararam-se com jornadas de trabalho extenuantes, condições de insalubridade, trabalho infantil, dentre outros abusos manifestos. Ademais, a substituição do trabalho humano pelas máquinas gerava desemprego em massa. Os trabalhadores estavam desamparados e surgiu a necessidade de intervenção do Estado para equilibrar essas relações.
A era da computadorização deu seguimento à onda iniciada pela Revolução Industrial de substituir o trabalho do homem, agora, pelo trabalho do computador. Mais uma vez as relações de trabalho sofreram alterações significativas e o trabalhador necessitou da proteção da lei.

Com o aumento do uso da computação o desemprego também seguiu a tendência do período anterior com uma redução significativa dos quadros de funcionários. Isso ocorreu devido à implementação de sistemas que executam sozinhos o trabalho que demandava vários empregados. Há que se considerar, entretanto, qual a parcela desse desemprego constituiu de fato falta de trabalho e quantos trabalhadores tão somente migraram para novos empregos ligados às carreiras que surgiram com o propósito de suprir as novas necessidades do mercado. Foi também nesse momento que houve um boom dos negócios inovadores, hoje conhecidos como start ups.
Nesta toada, o direito do trabalho precisou novamente se adaptar às realidades impostas, cobrindo agora questões como doenças decorrentes do uso contínuo do computador e a regularização das novas carreiras.
Foi também em decorrência do uso do computador que o trabalho efetuado remotamente, frequentemente nas residências dos empregados, hoje conhecido como home office ou teletrabalho, teve início. Em princípio, a maior parte desses trabalhadores eram informais, havendo pouca adesão das empresas ao seu uso por ser, por natureza, de difícil fiscalização.
No entanto, essa nova forma de organização do trabalho, quando utilizada com discernimento, traz vários benefícios para as partes envolvidas, por conglomerar flexibilidade de tempo, espaço e comunicação. A possibilidade de controle da própria jornada tende a aumentar a produtividade e eficiência do trabalhador remoto, além de reduzir o tempo e gasto com deslocamento e diminuir notavelmente a incidência da síndrome de burnout e reduzir a taxa de turn over.
As peculiaridades da natureza do trabalho remoto impõe algumas dificuldades em sua execução, motivo pelo qual importa, em condições normais, que a escolha dos profissionais aptos a realiza-lo seja feita caso a caso, levando em consideração fatores como a necessidade de instalação de equipamentos para adequar o ambiente residencial e seus custos, adequação deste ambiente quanto à possiblidade de isolamento e concentração, de organização de horário de trabalho, de critérios que estabelecem tranquilidade e autonomia para o profissional.
Algumas das vantagens para a empresa, além do aumento da satisfação do trabalhador, são a redução de gastos com aluguel (necessidade de menores espaços físicos), com deslocamento de funcionários e com cobertura de risco de acidentes de trabalho.
Apesar da sensação de novidade para muitas pessoas, a prática vem sendo adotada por vários países há anos, inclusive com previsão legal na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) de 1943, que, em seu artigo 6º previa “não se distingue o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado à distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.”
Já a Lei n. 12.551/11 determinou a equiparação dos direitos trabalhistas de trabalhadores remotos aos direitos do trabalhador convencional, conforme a CLT. Com essa mudança, o teletrabalho tornou-se mais seguro para o trabalhador e começou a expandir seu alcance no cenário empresarial.
Com o advento da reforma trabalhista consolidada na Lei 13.467/17, o teletrabalho foi, mais uma vez, objeto de regulamentação específica, conforme artigos 75-A a 75-E, o que demonstra a importância da prática frente ao aumento da adesão à ela.
Sob o ponto de vista jurídico, é importante que a legislação mantenha-se atualizada e em sintonia com as mudanças da realidade social, não perdendo de vista a necessidade de equilibrar a relação empregador-empregado, que, hoje distante da degradação chocante das fábricas lotadas de doentes trabalhando horas a fio, não possui, no entanto, mérito de fugir de excessos e abusos.
Com a materialização da pandemia do novo coronavírus (covid-19), o mundo teve que encontrar rapidamente formas de lidar com a necessidade de isolamento social das pessoas para reduzir a taxa de propagação do vírus, ao mesmo tempo que se tornou essencial a manutenção do funcionamento basal das empresas para evitar o colapso do mercado financeiro. Para satisfazer o imediatismo destas demandas o teletrabalho surgiu como uma ferramenta inestimável.
Tendo em vista a peculiaridade do presente momento, as dificuldades e ressalvas destacadas para a utilização do trabalho remoto constituem pequenos obstáculos à execução das tarefas, uma vez que mais importa manter as atividades, mesmo que com menos eficiência e rendimento, do que suspendê-las por completo. Há, claro, muitos profissionais que necessitam ser criativos e disciplinados para apresentar resultados em casas cheias de crianças e tarefas domésticas por fazer nesta fase de confinamento, mas os benefícios com certeza superam em muito as dificuldades enfrentadas.
No cenário atual, a prática exerce a importante função de evitar a interrupção total das atividades das empresas e órgãos estatais, cumprindo, ao mesmo tempo, com a necessidade de manutenção das atividades e de proteção do cidadão. Ampliando seu alcance além da tecnologia, abrange, assim, questões sociais e organizacionais de sobrevivência.
Também houve um aumento do escopo de atuação da tecnologia inicialmente criada para seu exercício, pois ao passo que originalmente tratava-se de ferramenta pensada para as pessoas cujos trabalhos independem de interação direta entre funcionários, com o avanço de tecnologias como o Skype, Google Meet, Google Classroom e Zoom, entre outras, a prática do home office pode alcançar também as questões interdependentes de vários setores organizacionais sem qualquer prejuízo para o resultado do trabalho.
Com as taxas de desemprego crescendo diariamente desde o início da quarentena, muitos empregos estão sendo mantidos em razão da possibilidade de uso do teletrabalho.
Especialmente no momento histórico em que vivemos, com a constante ameaça de contaminação pela covid-19 e com o colapso do sistema hospitalar pairando sobre nossas cabeças, fica evidente a importância dessa modalidade de trabalho, que, quando executado com compromisso e comprometimento, torna-se essencial para a sobrevivência de empresas e de pessoas. 
*Matheus de F. Corrêa da Veiga é formado pelo Centro Universitário IESB, pós-graduado em Direito Trabalho e Processo do Trabalho, IDP – Instituto Brasiliense de Direito Público, coordenador do Livro em Homenagem ao Ministro Aloysio Corrêa da Veiga, articulista do Livro em Homenagem ao Ministro João Oreste Dalazen, membro da comissão de Direito do trabalho da Seccional OAB/DF (2016/2018)/ (2019/2021). Em 2013 ingressou no Corrêa da Veiga Advogados como sócio
*Luísa B. B. Corrêa da Veiga, advogada, é formada pelo Centro Universitário IESB
Fonte: Estadão

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AS VIRTUDES DO DESPORTO

Por Maurício Corrêa da Veiga*
Especial para o blog Drible de Corpo
 
Desde o ano de 2013 se celebra, em 6 de abril, o Dia Internacional do Desporto ao Serviço do Desenvolvimento e da Paz por decisão da Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas.
A data foi escolhida em referência à realização dos I Jogos Olímpicos da era moderna, que tiveram início em 6 de abril de 1896, na cidade de Atenas. Neste ano de 2020, não teremos Jogos Olímpicos, pois como já foi amplamente divulgado, as Olimpíadas de Tóquio foram adiadas para 2021 devido à pandemia provocada pelo Coronavírus.
A linguagem do desporto é universal e tem a graciosa virtude de abraçar todos os povos a até de suspender guerras em um verdadeiro espetáculo de confraternização mundial.
O papa Francisco fez questão de enaltecer os ensinamentos que o desporto proporciona e lembrou que, neste momento, em que muitos eventos foram suspensos, “surgem agora os melhores frutos do desporto: a resistência, o espírito de equipe, a irmandade desportiva e o dar o melhor de si mesmo”.
O momento é de reflexão! Depois que esta pandemia cessar, não seremos mais os mesmos. Provavelmente, a União Europeia deixará de existir, ou pelo menos poderá sofrer grande transformação. Seremos mais solidários e tolerantes (qualidades que o desporto nos mostra com larga frequência).
 

O desporto tem um objetivo final: ajudar a formar e realizar o ser humano indicando-o o caminho para a felicidade, conforme ensina Manuel Sérgio. E o que é a felicidade senão a busca essencial da existência humana, o projeto fundamental de vida, conforme pregado por Aristóteles em Ética a Nicómano.

 
A Covid-19 nos mostrou que devemos deixar de lado o “eu” e pensar no “nós”, tal qual uma equipe bem entrosada. O trabalho do atacante fica dificultado e até mesmo impossibilitado se a bola não chegar aos seus pés. A “engrenagem” só funciona perfeitamente se cada um fizer a sua parte.
Infelizmente, muitas vidas foram ceifadas e outras terão o mesmo destino. Neste momento, é fundamental manter o equilíbrio entre corpo e mente, manter a rotina de exercícios físicos e também o mental.
O desporto tem um objetivo final: ajudar a formar e realizar o ser humano indicando-o o caminho para a felicidade, conforme ensina Manuel Sérgio. E o que é a felicidade senão a busca essencial da existência humana, o projeto fundamental de vida, conforme pregado por Aristóteles em Ética a Nicómano.
É curioso notar que, na sua origem, a atividade físico-desportiva constituía um processo de melhorar a destreza e a resistência necessária às lutas armadas. Ensina o professor José Esteves que a luta era uma excelente forma de preparação para o combate corpo a corpo, o lançamento de peso substituía as lanças e a cerimônia de encerramento dos Jogos Olímpicos era, durante séculos, a corrida com as armas.
Portanto, o que surgiu como forma de potencializar a guerra, atualmente é utilizado para celebrar a paz e unir nações difundindo valores de união e ética, ou seja, uma verdadeira “escola de virtudes” conforme afirmado pelo papa Francisco.
Sejamos fortes, pois tudo passa!
 
*Doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autónoma de Lisboa; Professor à contrato da Universidade La Sapienza de Roma; Membro da Comissão de Direito do Trabalho do IAB; Sócio do escritório Corrêa da Veiga Advogados

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Decisão do STF dá ‘equilíbrio’ à MP do Trabalho, mas provoca insegurança jurídica, avaliam advogados

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski de que os acordos de redução de salário e jornada de funcionários de empresas privadas apenas terão validade após a manifestação de sindicatos pode provocar, por um lado, insegurança jurídica nas relações de trabalho, e, por outro, dá equilíbrio a excessos da Medida Provisória do governo Jair Bolsonaro. Esta é a opinião de advogados da área trabalhista, que divergem sobre os impactos da MP e da decisão do ministro.
A medida faz parte do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda para evitar com que as empresas demitam durante o período da crise provocada pelo novo coronavírus. O ministro permite que os acordos individuais sejam usados pelos sindicatos para iniciar uma negociação coletiva da categoria. Se os sindicatos não se manifestarem, o acordo individual fica valendo.
“Tudo indica que a celebração de acordos individuais ‘de redução da jornada de trabalho e redução de salário ou de suspensão temporária de trabalho’, cogitados na medida provisória, sem a participação dos sindicatos de trabalhadores na negociação, parece ir de encontro ao disposto na Constituição”, escreveu o ministro, que submeteu a decisão para referendo do plenário do STF. Ainda não há previsão de quando a Corte vai se debruçar sobre o tema.

`Evidente inconstitucionalidade da MP’

Karen Viero, especialista em Direito do Trabalho, avalia que era evidente a inconstitucionalidade da MP 936/20 quanto à redução da jornada e do salário do trabalhador sem a anuência do sindicato da categoria.
“O ministro levou em conta o que vem ocorrendo nas relações trabalhistas no mundo capitalista nesta época de pandemia e decidiu que é válida a celebração de acordo individual de redução da jornada de trabalho e salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho, desde que comunicada pelos empregadores ao respectivo sindicato, no prazo de dez dias, para que este, querendo, deflagre a negociação coletiva. E caso a entidade não se manifeste, a inércia significará anuência ao acordado pelas partes”, afirma a sócia do Chiarottino e Nicoletti Advogados.
Cristina Buchignani, advogada especialista em negociações coletivas em geral, considera que a decisão resguarda o direito constitucional de representação da categoria. “Mas é de se esperar que o exercício desse direito se dê, efetivamente, com a finalidade maior de preservar empregos e renda, neste momento inédito em que o mundo se curva a um vírus”, diz a sócia da área trabalhista do Costa Tavares Paes Advogados.
Para a advogada Paula Corina Santone, “se por um lado é possível dizer que a MP 936/2020 representou um progresso em relação à redação original da MP 927/2020, que permitia a suspensão dos contratos de trabalho sem qualquer compensação financeira, por outro pode-se concluir que ela está eivada de flagrante inconstitucionalidade ao prever a possibilidade de redução de salários sem a participação sindical, mediante simples acordo individual entre empregado e empregador”.
Ela lembra que a Constituição Federal, ao tratar dos direitos sociais, prevê a irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo.
“Aliás, a própria reforma trabalhista que tanto prestigia o negociado sobre o legislado, igualmente determina que a pactuação de redução de salário ou jornada ocorrerá por convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho que deverá prever a proteção dos empregados contra a dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento, precisamente em conformidade com o texto constitucional que veda a irredutibilidade de salários, salvo negociação coletiva”, reforça. Na opinião da advogada, sócia da área Trabalhista do Rayes & Fagundes Advogados, a decisão busca promover a segurança jurídica de todos os envolvidos na negociação.
Mariana Machado Pedroso, advogada trabalhista, diz que a decisão do ministro Lewandowski visa compatibilizar a Medida Provisória 936 com a Constituição Federal. “É preciso acrescentar, como ponto de destaque dessa decisão do STF, o deslocamento da atuação sindical na proteção dos direitos do empregado que, como regra geral, se dá antes do acordo, durante a negociação, para depois do acordo firmado. Agora, eventual inércia do sindicato profissional poderá efetiva e diretamente prejudicar seu representado”, ressalta a sócia do Chenut Oliveira Santiago Advogados.

‘Decisão de Lewandowski traz insegurança’

Segundo Luís Augusto Egydio Canedo, sem entrar na questão jurídica de mérito, o que mais preocupa é a insegurança jurídica causada aos empresários e empregados. “Teria de haver um diálogo prévio entre os três Poderes para apresentar regras claras à sociedade. O Executivo traz uma regra, o Judiciário altera a regra emanada do Executivo e daqui a pouco o Legislativo edita uma norma diferente. Ao final, o que era para servir de socorro aos empregadores e empregados, adiciona insegurança jurídica ao atual ambiente de indefinição econômica”, critica o sócio do Canedo e Costa Advogados,.
Wilson Sales Belchior, conselheiro federal da OAB, avalia que “a determinação tem o potencial de causar dúvida razoável, reduzir a celeridade que foi pensada no design jurídico do Programa Emergencial e dificultar, em alguns casos, o recebimento dos benefícios”. Tudo isso “na velocidade em que os impactos econômicos e financeiros da pandemia se aprofundam, o que não retira a prudência buscada na decisão ao buscar conciliar a preservação máxima da norma impugnada e a proteção de direitos”, afirma o sócio de Rocha, Marinho e Sales Advogados.
O advogado especialista em direito do trabalho Mauricio Corrêa da Veiga explica que a decisão do ministro não proibiu o acordo individual, apenas estabeleceu uma condicionante, no caso a comunicação do acordo ao respectivo sindicato para que seja deflagrada a negociação coletiva. No entanto, Corrêa da Veiga alerta que é provável que os sindicatos não tenham, hoje em dia, musculatura para propor negociação com todas as empresas que optarem por fazer os acordos individuais que serão encaminhados ao sindicato e a inércia da entidade importará na anuência com o que foi estabelecido nos acordos individuais.
“É uma grande oportunidade para os sindicatos de empregados que forem atuantes, procurarem os sindicatos patronais para que sejam celebradas Convenções Coletivas, pois estas assegurariam maior segurança jurídica para todos os envolvidos”, afirma.
Segundo o advogado Willer Tomaz, embora intencionada para a garantia da equidade e do equilíbrio entre o empregado e o empregador, a decisão do ministro Lewandowski tende a gerar mais prejuízos do que benefícios e pode frustrar os objetivos da Medida Provisória.
“O momento de calamidade e urgência reclama maior dinamicidade e flexibilidade nas negociações, de modo que a anuência sindical como requisito de validade para cada acordo individual firmado no país impõe entraves capazes de frustrar, ao menos parcialmente, os objetivos da MP 936, pois a demora, o aumento da burocracia e o acirramento do conflito de interesses desestimulam uma possível composição amigável entre os sujeitos da relação jurídica trabalhista, tendendo a aumentar, na prática, a quantidade de demissões e de fechamentos de pequenas empresas”, explica Willer.
Luis Fernando Riskalla, especialista em Direito do Trabalho afirma: “O que se mostra, em especial para os empresários, com a necessidade de intervenção do sindicato para validar a negociação, é principalmente uma grande insegurança jurídica, pois não sabemos se o sindicatos vão tender no sentido de convalidar o texto da Medida Provisória ou se simplesmente irão contra o texto”.
“Ou pior, se vão se quedar inertes ou se não se pronunciarão sobre o tema”, avalia o e sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados.
Carlos Eduardo Dantas Costa, especialista em Direito do Trabalho diz que a MP dá a possibilidade de o empregador reduzir ou suspender o contrato. “Nessa hipótese, o trabalhador recebe um valor, que é variável, de acordo com o que foi feito (suspensão ou redução e o percentual de redução). Mas a MP também possibilita que o empregador pague um “benefício”, sem natureza salarial (ou seja, sem encargos e reflexos), para complementar a renda do trabalhador. Mas esse “benefício” é uma faculdade, ou seja, a empresa, em um primeiro momento, não tem obrigação. Na prática, muitas empresas estão estudando implementar a redução ou suspensão e fariam essa complementação”, explica.
Com a decisão, a tendência é que as empresas “guardem essa gordura (o benefício pra conceder na negociação, segundo ele. “Mas pode acontecer (e muitas vezes será o caso) de a negociação nem vir a acontecer – seja por falta de interesse do sindicato, seja porque ele não dará conta de atender o prazo que a decisão fixou. Assim, no final, o trabalhador poderá ser prejudicado, porque não receberá o benefício”, afirma o sócio do Peixoto & Cury Advogados.

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Opinião: advogado desportivo sugere jogos com portões fechados como forma de preservação da saúde física, mental e financeira dos atletas

Por Maurício Corrêa da Veiga*
Especial para o blog Drible de Corpo
 
A pandemia provocada pela Covid-19 mudou a vida de quase todos os habitantes do planeta. Cautela e cuidados são exigidos como forma de conter a propagação do vírus. O isolamento domiciliar tem sido a medida mais eficaz para se evitar uma tragédia ainda maior.
Nas competições desportivas muitos patrocinadores deixaram de efetuar pagamentos tendo em vista a suspensão das atividades. As empresas responsáveis pelas transmissões das partidas suspenderam os pagamentos e, com isso, os clubes perderam receita. Os prejuízos são incalculáveis e o efeito “dominó” atinge a todos, inclusive atletas e empregados das entidades de prática desportiva.
As suspensões dos contratos de trabalho e redução salarial estão ocorrendo em praticamente todo o mundo.
Na Romênia, a lei que autorizou a decretação do estado de emergência no país possibilitou que clubes suspendessem os contratos de trabalho de seus atletas. Muitos jogadores tiveram perda salarial de até 95% e solicitaram subsídio do governo local, importância equivalente a aproximadamente R$ 2.800.
Os jornais têm noticiado que muitos atletas concordaram com a redução expressiva de seus salários. De acordo com a imprensa, Lionel Messi e outros atletas do Barcelona aceitaram uma redução de 70% em seus salários.
O Sporting Lisboa estuda a possibilidade de reduzir os ordenados dos jogadores de sua equipe principal até 40%.
No Brasil, a MP 936 autorizou a suspensão de contratos de trabalho e redução de salários e de jornada. Contudo, convém frisar que a medida está sendo contestada no STF, que em decisão cautelar em Ação Direta de Constitucionalidade condicionou a validade dos acordos individuais à submissão destes aos sindicatos profissionais.
A redução de vencimentos é uma realidade e os atletas terão que fazer concessões, aceitar parcelamentos e até reduzir salários, como forma de viabilizar o emprego.
Em alguns países, mesmo com as restrições impostas pela decretação de estado de emergência (ou calamidade pública), as atividades dos atletas profissionais estão asseguradas, desde que observadas medidas de precaução.
O estado de emergência, em Portugal, foi renovado em 2/4/2020 e entre as medidas adotadas está o encerramento de atividades desportivas, salvo quando destinadas à atividade dos atletas de alto rendimento. Na Alemanha, os clubes estão autorizados a treinar.
Esta situação inesperada tem provocado a adoção de medidas urgentes e extremas. Muitos clubes não terão condições de sobreviver quando a pandemia terminar. A carreira de muitos atletas estará comprometida, ainda mais quando se trata de uma atividade profissional de curta duração. Muitas questões podem ser retomadas e recuperadas, mas não o tempo, este é implacável e não tem como ser “suspenso” ou restituído.
Uma alternativa que se propõe para amenizar essa situação caótica e inédita é a retomada das competições com a realização e jogos com portões fechados. Tal medida seria adotada em caráter provisório e excepcional, com a adoção de todas as medidas necessárias à segurança dos atletas e das pessoas envolvidas para a realização das partidas. O número de pessoas deveria ser reduzido.
Desta forma, as transmissões estariam asseguradas e a audiência estaria garantida na medida em que as pessoas estão em suas casas.
Os Tribunais de Justiça Desportiva poderiam continuar com suas atividades, de forma remota, e assegurando a sustentação oral dos advogados via videoconferência, como forma de assegurar a lisura e com andamento dos campeonatos.
As competições estão paralisadas há um mês, porém, os atletas continuam com treinamentos, provavelmente não no mesmo ritmo e intensidade de períodos de normalidade, mas a continuidade da atividade é vital para a higidez física e psicológica do atleta.
Para o atleta, a manutenção de uma rotina de treinos é essencial para sua própria sobrevivência, diminuição da ansiedade e produção de endorfina sendo que o treino acompanhado não pressupõe apenas o condicionamento físico, mas também o desenvolvimento e orientação mental.
Devemos ter em mente que a grande maioria dos atletas não recebe salários milionários e tem que lidar com situações de ansiedade e frustração, fatores que podem ser potencializados neste período de ausência de convívio social.
 
*Doutorando em Ciências Jurídicas pela Universidade Autónoma de Lisboa; Professor à contrato da Universidade La Sapienza de Roma; Membro da Comissão de Direito do Trabalho do IAB; Sócio do escritório Corrêa da Veiga Advogados.

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Redução de salários expõe divergências entre clubes e jogadores

Por iG Esporte | Cleber Mattos
A pandemia do novo coronavírus tem afetado de forma contundente a situação financeira dos clubes brasileiros. Muitas equipes estão reduzindo os salários dos jogadores na tentativa de amenizar o impacto econômico diante da crise. Mas o corte nos ganhos dos atletas não é uma decisão simples de ser colocada em prática, sobretudo nos clubes gigantes.
Algumas agremiações encontraram relutância dos jogadores ao formalizarem a proposta de redução. Em princípio, houve uma tentativa de acordo da CNC (Comissão Nacional dos Clubes), que sugeriu um corte de 25% nos salários dos jogadores. Porém, a Fenapaf (Federação Nacional dos Atletas Profissionais) rejeitou a proposta. Diante deste cenário, coube a cada clube a negociação com seus próprios jogadores.
As tratativas, como era de se esperar, encontraram entraves. No São Paulo , a diretoria impôs um corte de 50%, mesmo sem a concordância dos atletas. A falta de um acordo prévio com os jogadores não tem respaldo jurídico, mas é uma atitude emergencial diante do atual cenário, como explica o advogado Mauricio Corrêa da Veiga, especialista em direito trabalhista e desportivo.
“Tanto os clubes de futebol, como qualquer empregador, não podem reduzir salário sem a anuência do empregado. Porém, é fundamental que o atleta tenha a consciência de que o momento atual requer uma compreensão maior”, diz Mauricio.
Santos foi outro clube paulista que encontrou resistência dos jogadores ao propor uma redução de 50% dos salários . Após uma contraproposta, clube e atletas se acertaram e o Peixe irá cortar 30% a partir de maio.
Quem também se mostrou contrário a ter seus ganhos reduzidos foi o lateral Guilherme Arana, do Atlético-MG . “Acho que não justifica (a redução). Eu acho que a gente, jogador, não tem nada a ver com isso. Temos que seguir as coisas que o pessoal vem passando na TV, o que os doutores falam. Essa redução de salário, na minha opinião, não convém porque é o mundo que está paralisando”, afirmou o atleta em entrevista ao Fox Sports, no final de março. Pouco depois desta declaração, no entanto, o Galo oficializou o corte de 25%.
Diante das divergências nos posicionamentos de clubes e jogadores sobre o assunto, é natural que se especule possíveis ações dos atletas contra as agremiações em um futuro próximo. Quanto a isso, Mauricio esclarece:
“O atleta poderá entrar com reclamação trabalhista, mas isto não quer dizer que ele logrará êxito em sua demanda, tendo em vista que muitas serão as teses de defesa dos clubes. Uma delas poderá ser a de que o salário integral não era devido pois a prestação de serviços não estava sendo cumprida de forma integral, ou seja, o salário é uma contraprestação devida pelo trabalho. Tendo em vista que o trabalho não estava sendo desempenhado de forma plena, em que pese o tempo à disposição”, pontuou o advogado.
Mauricio também ressalta que uma possível punição aos clubes fora do âmbito jurídico seria difícil de acontecer. “Na área desportiva, pelo fair play financeiro, até poderia haver sanções, mas é muito pouco provável”, finalizou.
 

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Em vitória do governo, STF confirma MP que permite acordos individuais de redução de salários

BRASÍLIA (Reuters) – O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta sexta-feira validar a Medida Provisória 936, editada pelo governo Jair Bolsonaro, que permite a realização de acordos individuais entre empregadores e trabalhadores estabelecendo a redução temporária de salário e jornada de trabalho ou mesmo a suspensão de contratos.
Em julgamento no plenário, sete ministros votaram para rejeitar pedido apresentado pelo partido Rede Sustentabilidade que visava suspender os efeitos de trecho da medida provisória. Dessa forma, a MP editada está valendo na íntegra —ela ainda está sendo objeto de apreciação do Congresso Nacional, que pode modificar seu texto.
A decisão representa uma vitória do governo no Supremo, que lançou mão da MP em meio à forte redução da atividade econômica em razão de medidas de isolamento social durante o avanço da pandemia do novo coronavírus no país.

Mais cedo nesta sexta, o secretário especial de Previdência e Trabalho, Bruno Bianco, afirmou que mais de 2 milhões de trabalhadores já fecharam acordos com seus empregados sob as regras da MP 936. Ela permite a redução temporária de salários e jornadas ou a suspensão do contrato de trabalho, com pagamento de uma compensação parcial pelo governo.
A maioria da corte seguiu o voto do ministro Alexandre de Moraes, que abriu divergência e se manifestou integralmente a favor da medida provisória: Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes e Marco Aurélio Mello e o presidente do STF, Dias Toffoli.
Os ministros derrubaram a liminar que tinha sido parcialmente concedida pelo relator da matéria, Ricardo Lewandowski, determinando que sindicatos das categorias dos trabalhadores deveriam ser comunicados dos acordos individuais fechados para se manifestarem.

No julgamento da liminar no plenário, Lewandowski manteve seu voto, que ficou vencido. Outros dois ministros, Rosa Weber e Edson Fachin, também ficaram em minoria, manifestando-se pela derrubada total do trecho da MP que permitia esses tipos de acordos individuais.
O advogado trabalhista Marcelo Faria, do escritório TozziniFreire Advogados, disse que a decisão do plenário do STF restabelece a integralidade da MP, “com relação a legitimidade dos acordos individuais firmados entre empregado e empregador, sem precisar passar pela validação do sindicato laboral, dando maior segurança jurídica e com o objetivo da preservação do emprego, sem deixar de considerar que a MP ainda passará por todo o processo político perante o Congresso Nacional.”
O advogado Mauricio Corrêa da Veiga, sócio do Corrêa da Veiga Advogados, destacou que não se está numa situação de normalidade. “A força maior provocada pela pandemia vai exigir uma interpretação cautelosa da legislação, devendo ser preservado o bem maior que é a dignidade da pessoa humana e a preservação do emprego e das empresas. A Constituição é um todo e assim deve ser interpretada, tal como decidiu o STF”, disse.

Reportagem de Ricardo Brito

Fonte: Reuters

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Equanimidade x autopreservação: a dicotomia da Justiça na Covid-19

Por Luísa Bahia Barretto Corrêa da Veiga e Matheus de Figueiredo Corrêa da Veiga
“A lei jamais tornou o homem mais justo, e, por meio de seu respeito por ela, mesmo o mais bem-intencionado transforma-se diariamente em agente da injustiça”.
Henry David Thoreau explicitou em seu pensamento uma questão dura e real. Não é a lei que faz o homem mais justo. Justiça é um conceito amplo que abrange questões de cunho moral, cultural e ético. As palavras escritas por legisladores no exercício da atividade governamental — que têm por objetivo pautar as ações dos cidadãos — não seriam capazes de incorporar esse conceito tão complexo.
Assim, o homem que busca legitimar seu senso de justiça pelo cumprimento cego da letra da lei e pelo uso desta em benefício próprio, ao custo do prejuízo do Estado, incorre no mais grave dos males, o de ser voluntariamente injusto, mesmo que juridicamente legal.
É possível identificar vários cenários que exemplificam isso no cotidiano. Mas, em tempos de exceção, quando as circunstâncias demandam alterações drásticas no comportamento social e quando a solidariedade parece vir para a superfície, as injustiças assumem novas formas, mascarando-se de generosidade e preocupação. Nesses momentos a virtude do homem justo dá lugar à defesa do interesse pessoal, a autopreservação.
Com a chegada da pandemia do novo coronavirus (Covid-19), os estados precisaram apressar-se para responder com agilidade às novas demandas, para lidar com a necessidade de cobrir, em curto espaço de tempo, questões de saúde pública, segurança pública, investimento, mercado, entre tantas outras.
Esses movimentos geram gastos astronômicos para os governos e, em países como o Brasil, onde há pouca cobertura por orçamento de emergência, são frequentemente deduzidos de reservas destinadas originalmente a outras finalidades. Por isso é de suma importância a conscientização da população para que o uso das medidas emergenciais seja restrito aqueles que precisam de fato delas. Não se pode cumprir o papel de cidadão justo quando, sob essas circunstâncias, o interesse particular é colocado acima do bem da Nação.
Entre tantas condutas protetivas a serem tomadas pelo governo, as Medidas Provisórias 927, de 23 de março de 2020, e 936, de 2 de abril, ganharam destaque, pois delas decorre grande compromisso econômico do Estado para salvaguardar empregos, renda e, consequentemente, empresas privadas, consolidado no Benefício Emergencial de Preservação de Emprego e Renda.
Em breves termos, este assumiu um volumoso gasto público que decorrerá do pagamento da parcela complementar do salário dos trabalhadores que firmarem acordo de redução salarial. Desses acordos também decorrerá uma significativa redução no recolhimento de FGTS, INSS e Imposto de Renda, que não poderão ser exigidos nesses casos por se tratar de parcela de natureza indenizatória, não salarial. Há ainda a postergação do pagamento das parcelas do FGTS de março, abril e maio do ano de 2020, sem a cobrança de juros ou multa, que também causará redução na arrecadação dos meses economicamente críticos para o Estado (e para todos, é claro).
Ainda sob encargo do Estado ficará o aumento substancial de pagamentos de valores equivalentes às parcelas do seguro desemprego para os trabalhadores que firmarem acordos de suspensão do contrato de trabalho, uma vez que nesses casos o governo arcará com o valor total ou ao menos 70% do valor a ser repassado para o trabalhador. Importa lembrar que parte desses valores seria, de qualquer forma, exigida do Estado no caso da dispensa de empregados que teriam direito ao seguro-desemprego, mas constituiria da mesma forma sobrecarga inesperada para os cofres da seguridade social.
Essas normativas foram criadas com o objetivo de oferecer alternativas à dispensa de funcionários e, também, de dar suporte financeiro às empresas que foram muito abaladas pela necessidade do isolamento social, mas deixaram nas mãos do empresário a decisão acerca da real necessidade de usufruto desses benefícios. Trata-se de questão de cunho moral baseada no senso de justiça que deve levar em consideração o sacrifício econômico ao qual já se encontram submetidos o Estado e a população.
Sobre o empresário recaiu, assim, a obrigação moral de fazer uma análise profunda da situação econômica em que se encontra sua empresa, uma vez que é possível que esteja sofrendo consequências financeiras graves, mas suportáveis (em decorrência do seu porte, setor de atuação, reservas, etc.). Também é possível que, pelo contrário, seu risco de falência esteja muito alto e sua sobrevida à pandemia dependa em grande parte de ajuda externa.
A partir dessa análise, ele tem a discricionariedade de assumir uma de duas posturas. Por um lado, pode fazer uso da prerrogativa de se beneficiar com o teor das MPs sem incorrer em ilegalidade, mas com grave risco de praticar grande injustiça. Ou pode julgar por si a capacidade de sua empresa suportar os prejuízos já contabilizados e os futuros e, caso conclua que não necessita do suporte oferecido pelo governo para manter seu negócio e seus funcionários, fazer a livre opção de simplesmente não os solicitar.
A decisão está ligada intrinsecamente à questão levantada por Thoreau. Seu comprometimento com sua função social e com a responsabilidade pelo risco empresarial serão de grande valia neste momento. Sacrifica-se economicamente ao manter funcionários que lhe custam caro em tempos nos quais o faturamento sofreu grande redução na busca por equilibrar a complexa equação financeira que teve início com a calamidade ou beneficia-se da prerrogativa estabelecida pela lei e faz uso do dinheiro oferecido pelo Estado.
É, de fato, uma questão complexa e profunda. São muitas variáveis a serem consideradas e o senso de autopreservação que manteve a empresa saudável até aqui urge que faça uso de todas as ferramentas que estiverem à sua disposição em tempos de incerteza.
Mas é importante a percepção de que todas as partes (Estado, empresas, trabalhadores) compõe o mesmo sistema, portanto, o prejuízo de um irá, invariavelmente, causar danos aos demais no final do ciclo. A sobrevivência das empresas depende também do funcionamento da máquina estatal. Portanto, a vigilância dos valores morais no processo de sobrevivência garantirá uma tomada de decisões que levarão em conta todos os elementos dessa equação, para que ao fim a nação volte a prosperar como um todo.
Aqui, o uso da equanimidade no julgamento torna-se valioso para ponderar as necessidades de todas as partes, bem como o entendimento de que as mudanças fáticas demandam mudanças comportamentais e adaptação de todos. Aceitar que, em proporções diversas, todos estão perdendo algo, mas muitos estão perdendo mais do que podem suportar.